Uma pequena notícia, perdida nas páginas secundárias dum jornal sem dono, sem leitores e sem prosa, um pequeno texto que dá corpo a uma decisão. Afinal, pouco importante, era uma notícia igual a milhares de outras esquecidas.
1 - Eduarda Fragoso, professora de artes visuais, cansada de fazer e desfazer malas, correndo escolas por todo o País, sem presente e sem futuro, tomou uma decisão que de repente lhe pareceu o caminho certo.
Tinha trinta e cinco anos de idade, quinze de esperanças frustradas. Vivia num quarto rodeada dos seus pertences, não eram muitos, uma mala de viajem era suficiente para os guardar.
Naquele espaço simples com uma janela virada para o rio, ia perdendo, dia após dia a capacidade de sonhar.
Acabara de confirmar que não seria colocada. Nem reagiu, estava farta de promessas, via o tempo a correr vertiginosamente e ela sem forças para o agarrar.
Tomou uma decisão. Telefonou à amiga Margarida, licenciada em farmácia mas que acabara de ser despedida e aceitou o convite que ela lhe fizera. Abandonar o País sem futuro e correndo os riscos de quem escolhe outro destino, procurar em outro lugar uma oportunidade de dar sentido às suas vidas.
Margarida não demorou a juntar-se à amiga. Com ela levava um saco de viagem, umas centenas de Euros que recebera do subsídio de desemprego, e uma enorme força de lutar.
O destino? Nem tinham pensado bem, o fundamentar era deixar este País que as rejeitava, devastado pela incompetência, pelo compadrio, pela esperteza saloia, pela corrupção desenfreada. Partir deixando os sonhos que já não conseguiam sonhar. Partir é morrer um pouco, dizia o Poeta, mas para elas, duas mulheres esquecidas entre tantas, partir era um renascer. Algures no caminho, encontrariam alguém que as ajudaria a recuperar o tempo perdido. Ou então seria o fim da jornada.
Tinham um objectivo simples, sair e caminhar. Para já tinham comprado bilhetes baratos para viagem até Londres. Depois?
Sentiriam saudades do sol que teimava em brilhar, dos amigos que levavam no coração, e da família que iria sofrer mas aplaudiriam a sua decisão. Porque eles, os Pais choraram quando pediam perdão de não teres deixado para elas um mundo melhor. Tinham sofrido, trabalhado de sol a sol para lhe darem uma formação a que nunca tiveram acesso. Mas tudo fora em vão, como a esperança que deixaram morrer.
No silêncio daquele pequeno quarto, apesar da força que as animava, deixaram fugir uma lágrima. Para além do abandono, das desilusões, havia ainda dentro delas, aquele sentimento que não se explica, nem se compreende.
Por isso e em nome dessa força que receavam lhes faltasse durante o caminho, fizeram um juramento.
-Mãos nas mãos, olhos nos olhos, tinham jurado, não mais voltar.
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