segunda-feira, 27 de maio de 2013

O PREÇO SO SUCESSO


EM LISBOA

Perdera-se nos corredores do Aeroporto, escala no seu regresso a casa. Regresso a casa, que ironia, casa ele nunca tivera. Na realidade ter casa ignificava ter um espaço onde sentisse o carinho de uma família com amor abençoado com risos de criança. Nada disso tivera. Apesar do dinheiro, dos frequentes encontros amorosos, das promessas de amor que duravam apenas alguns meses, nunca sentira estar em casa, na sua casa. E não poderia ser de outra forma porque sempre esquecera os compromissos. Outros valores tinham sido sempre prioritários e o principal fora a sua ascensão no mercado financeiro.

Encontrou a sala vip, serviu-se de mais uma bebida, olhou para o relógio. Nem queria acreditar, depois de mais de doze horas de viajem tinha agora pela frente uma espera de oito horas. Perguntava-se como havia programado um itinerário tão apertado e que o estava a consumir mas a resposta ele receava. Fora um pressentimento de que o mundo das finanças estaria à beira de um colapso, tantos erros que a ganância e o desregulamento do mercado bancário haviam propiciado. 

No vasto salão, cheio de passageiros em espera, conseguiu encontrar um espaço para descansar e delinear uma estratégia de modo a prevenir uma temida derrocada dos mercados, que adivinhava próxima, muito dolorosa e difícil de controlar. Não arriscou esperar mais tempo. Ligou o laptop, começou a percorrer os ativos que o seu fundo geria e foi transmitindo ordens de venda, sem agressividade mas dando prioridade à venda de contratos derivados baseados em fundos imobiliários. Tinha seis corretores a trabalhar na sua Empresa mas a gestão do risco ficara sempre a seu cargo. Os corredores receberam instruções para vender os produtos em carteira que indicou, mas não a qualquer preço pois o mercado estaria atento e a bolha especulativa poderia rebentar.

Esteve mais de duas horas a acompanhar a abertura da bolsa em Wall Street, apercebeu-se de alguma oscilação nas cotações dos títulos mais expostos, mas nada que não fosse previsível. O seu Fundo estava a vender sem grandes efeito nas cotações, sinal que o trabalho estava a ser feito como ele ordenara. Esteve atento até ao encerramento da bolsa em Nova Iorque.

Descansou e olhando para o placard reparou que o próximo voo tinha como destino Lisboa. Aqui tão perto, porque não aproveitar e relembrar a Lisboa a cidade que tanta influência tivera na sua vida?

Já não visitava o País há mais de dez anos, fora umas viajem dolorosa e que procurara esquecer. Viera para o funeral do Pai mas encontrou a Mãe que o recebeu como um desconhecido. Nem um sorriso, um beijo ou abraço sequer. Apenas um aperto de mão cerimonioso com que recebia todos os amigos.

Ficou dois dias em Lisboa, instalado num hotel, já que a Mãe lhe deu a entender que ele, o filho ingrato, não tinha lugar no apartamento de Lisboa.

Ferido com a indiferença, que aliás já esperava, foi surpreendido com um contacto de um escritório de advocacia, sugerindo uma reunião para tomar conhecimento dos termos do testamento do Pai e decidir sobre a sua parte. Não respondeu e antes de regressar a Nova Iorque, procurou a Mãe apenas para lhe dizer que ele, Ricardo, prescindia dos seus direitos e assinou em termo de renúncia á sua parte da herança. Deixou o documento das mãos da Tia, a Mãe mandara dizer que estava indisposta e cumprida esta formalidade embarcou de regresso à América.

A tia continuava a ser a sua única ligação à família. Escreviam-se e foi por ela que soube que a Mãe havia constituído uma sociedade para exploração do negócio, de cuja direção se afastara, reservando apenas uma quota-parte de 10%.

Ricardo tomou a decisão de relembrar a velha cidade. Era um pequeno desvio mas sentia a nostalgia que tinha perdido quando se aventurou em outros destinos, onde não havia espaço para a saudade e para a nostalgia. Tivera sucesso e as memórias perdidas fizeram parte do preço que pagara.

E de repente lembrou aquele dia triste dum manhã de Dezembro em que percorreu o Aeroporto de Lisboa aguardando a hora de embarcar para o seu destino. Estava só, nem um amigo lhe fizera companhia. Lembrou o medo que sentira, era uma aventura o que o esperava, mais medo porque sentia que só com ele poderia contar. Na mão o bilhete e o passaporte com o visto e a certidão de que fora admitido a uma pós graduação na Universidade de Columbia. Eram o seu tesouro, a porta que se abria para um futuro que idealizara mas que agora, da solidão do Aeroporto também temia.

Talvez se tivesse precipitado. A recusa da Mãe até a compreendia mas o aperto que sentia no peito tinha um nome, Mariana.

 E como naquela manhã chuvosa e fria do mês de Dezembro, também hoje, tanto tempo decorrido, deixou que uma lágrima se soltasse.

 

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