UM SONHO ... CONTADO
Por vezes, agora com mais
frequência, sonho o passado longínquo. E revejo-me da personagem duma criança
acabada de nascer. Será estranho, sinto isso, por vezes inquietante, mas poderá
ser um sinal. Rever momentos duma vida preenchida e reencontrar as pessoas mais
importantes poderá significar o princípio e o fim.
Era um ano difícil, duro, como
todos eles, naquele tempo.
Deitada na cama de uma casa
grande e pobre, perdida nos arredores de uma pequena cidade do Alto Alentejo,
uma mulher ainda jovem sofria as dores do parto. Era uma mulher frágil mas determinada
e dona de uma personalidade sensível mas lutadora. A seu lado uma vizinha
habituada à função de parteira, tantas vezes chamada para aqueles momentos,
onde uma vida se ganha ou se perde.
Esta mulher ganhara a
experiência por ter assistido a tantos momentos de alegria e, também, alguns momentos
de dor. O seu saber de experiência feito permitia-lhe dirigir o trabalho de
parto, orientando os esforços da futura mãe e ajudada por outras mulheres mais
jovens e da família da parturiente.
Como era afinal naqueles
tempos, nascer ou morrer era sobretudo uma força do destino. O recurso ao
hospital era um privilégio.
Daquele dia do verão de 1942,
enquanto mulheres ajudavam a nascer, por este mundo milhares de pessoas morriam
cada dia, vítimas inocentes duma guerra de genocídio e de interesses comerciais
e financeiros. Como, aliás, todas as guerras conhecidas. E foi no calor daquele
longínquo verão, que a criança nasceu. A parteira cortou o cordão e olhando a
mãe dorida, anunciou:
- Vizinha é um menino, frágil
mas que irá crescer para sua alegria!
E o sonho acabou.
O despertador tocou, era hora
de levantar. A alegria de ter revivido os momentos em que esteve nos braços das
pessoas mais importantes da sua vida, e que tantas vezes ouvira contar,
tornaram-se uma força que o acompanharia por mais um dia…
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