QUATRO SONHOS
A M O R
A CASA NA COLINA
8 – OUTONO
Entretanto ao cair da noite de Domingo o Joaquim levou-o a uma outra
aldeia, onde Manuel o aguardava.
Comeram quase em silêncio depois saíram sentaram-se num cadeirão, encostado
à parede e virado para o horizonte e começaram a fumar.
Luís experimentou acender o cigarro, sem resultado, mais outro e acabou por
desistir. Aquele encontro poderia ajudar a perceber o caminho mas…
Foi o Manuel que, fixando o olhar no Luís começou a conversa.
- Eu acredito que tem sido difícil este momento. Sei que sentiu o prazer e
a alegria do verão, mas agora é preciso ganhar forças para enfrentar o Outono.
Digo isto porque não terá sido fácil enfrentar que Joana partiu. Confesso que
para mim não foi uma surpresa. E vou contar uma estória que talvez o ajude a
conhecer o drama que minha irmã tem vivido e, espero, essa história lhe dê
forças para esperar.
A casa na colina, como já percebeu teve uma ligação muito forte à minha
irmã. Foi uma ligação de entrega, amizade amor e dor. Admito que ela se
escondeu e que ande, perdida no meio de pessoas, duma grande cidade, vivendo o
medo do futuro. Medo por ela mesmo, por recear não ser capaz de esquecer o
passado que tanto a feriu.
O Luís trouxe-lhe um novo alento,
talvez não se tenha apercebido, mas Joana apaixonou-se e não foi capaz de
reconhecer o amor. Fugiu, quem sabe, um dia voltará.
E para entender o medo da minha irmã, deixe-me contar uma história de amor,
que se transformou em dor e sofrimento.
“ Quando o nosso Pai morreu, tinha eu quinze e Joana dezoito anos de idade,
foi um choque que mexeu na nossa vida. Joana, estava em Lisboa no primeiro ano
da faculdade de medicina. Fora sempre uma aluna exemplar, orgulho dos Pais que
tudo fizeram para que ela seguisse o sonho.
Mas a vida é, por vezes, madrasta. Ainda não refeitos da morte do nosso
Pai, e num espaço de algumas semanas, a minha pobre Mãe seguiu o mesmo caminho.
De repente o destino entregou a Joana a responsabilidade de garantir o
nosso sustento e o futuro seria o que Deus quisesse. Mas o sonho da
universidade ficou por ali.
Eu perdi-me, deixei-me levar por caminhos ínvios e ela encontrou-me, deu-me
carinho e salvou-me.
Joana namorava desde os bancos da escola, com um colega, filho único de uma
família considerada e toda a gente acreditava no casamento.
Também ele, Duarte é o seu nome, seguira para Lisboa mas escolhera outro
caminho.
O destino pode trazer felicidade e dor. E Joana recebeu, apenas, dor.
Duarte que conquistara o seu coração não era o homem certo. Joana regressou
a casa e ele continuou em Lisboa, depois no Porto, a fazer ela não sabia o quê.
Os Pais do Duarte eram pessoas simples mas com algumas propriedades. Tinham
a casa onde viviam, uma casa grande nos arredores de Beja e uma pequena casa,
esquecida no cimo dum monte.
O filho regressou a casa, perseguido por credores de dinheiro que gastara
no jogo e no consumo de droga. Pagar era uma questão de vida ou de morte. Obrigou
o Pai a vender as melhores terras, a melhor casa e apenas lhes deixou a casa da
colina. Entretanto desapareceu.
Joana tinha por hábito subir até a casa da colina. Para ela era o momento
de fuga aos desgostos que a vida lhe reservara.
E foi numa dessas visitas que encontrou os Pais do Duarte que não lhe
souberam esconder que com eles apenas tinha levado os desgostos, a pobreza e a
doença.
Joana investiu algumas, pequenas, poupanças e assegurou condições de vida
para aquele casal.
Entretanto a doença da Dona Elvira agravou-se e foi internada no Hospital
de Beja. Numa das visitas o médico chamou Joana de parte, dizendo-lhe que o
hospital pouco poderia fazer por uma doente, sofrendo de uma doença sem cura,
apenas era sujeita a cuidados paliativo e que chorando pedia para voltar para
casa. E eu, digo-lhe, não apenas como médico mas como ser humano, que ela terá
um fim menos doloroso, em casa, junto das pessoas que ama.
O marido, o senhor Jorge, olhou para Joana e com os olhos rasos de
lágrimas, pediu ajuda. Joana abriu os braços e disse sim. Para aquela pobre
família destruída, passou a ocupar o lugar da filha que eles haviam sonhado.
Foi assim durante mais de cinco anos, até que um dia, a minha irmã foi a
Beja levantar a medicação, e voltou a correr para a casa da Colina. Sentiu um
pressentimento, lembrou-se do beijo que o Senhor Jorge lhe dera quando ela
montara a motocicleta para ir a Beja. Sim o calor do beijo tinha um sabor de
despedida.
Conduziu com a máxima velocidade que a motoreta lhe permitia, subiu a
encosta e entrou na casa da colina.
E o pressentimento transformou-se em realidade. Na cama jazia a Dona Elvira
e deitado a seu o marido que a decidira acompanhar na última viagem.
Na pequena mesa do quarto Joana encontrou a nota Jorge escrevera antes de
pôr termo à vida e que dizia:
“ Joana:
Do fundo do coração obrigado por tudo o que nos deste. Foste a única
alegria que vivemos depois do abandono a que por amor tivemos de enfrentar, Tu
foste a luz, o riso e a alegria para dois velhos cansados. Mas tudo tem um fim.
Vamos fazer a viajem com um ultimo pedido. Se o nosso filho, Duarte aparecer pedindo ajuda, em nome de Deus dá-lhe o teu abraço. Não chores, tu mereces ser feliz.
Adeus
Elvira e Jorge.”
Manuel acabara de contar a história da casa na colina. Uma história de amor
que ficara gravada no coração de Joana e permanecia viva em qualquer canto
daquela casa. Olhou para Luís e rematou:
- Luís percebe a razão por que Joana se escondeu?
Luís acenou o sim e afastou-se.
Ficou perdido entre a esperança do reencontro e a dor esquecimento.
Decidiu que a casa da colina seria o seu lugar. Talvez Joana voltasse com o Outono.
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