quinta-feira, 7 de maio de 2015

A CASA NA COLINA












 


A CANÇÃO DESESPERADA


 


Os corpos suados, esgotados naquele momento em que esqueceram o mundo, os desgostos, as dúvidas, mostraram a força das mãos cravadas com desespero, quase raiva.


Quase sem se olharem, vestiram-se e estenderam na sombra da árvore que Luís havia transformado no se refúgio.


Joana viu o livro. 


 


- Luís não quer ler para mim? Gostaria de o ouvir dizer os versos da canção desesperada. Sim, porque uma canção desesperada, sobretudo dita depois da loucura em que nos deixamos envolver, representará os gritos de amargura que já soltei na minha vida.


- Luís leu o poema e a cada estrofe, sentiu um arrepio como se cada estrofe fosse uma ferida que teimava em não desaparecer.


 Acabou sem dizer uma palavra. A canção desesperada seria como um hino para duas vidas, desencontradas, cheias de incerteza e de dor e que aproveitavam cada momento em que se amavam com o estertor dos corpos e almas massacradas.


Sim, Luís deixara de ter dúvidas. Ele sabia que carregava uma morte anunciada mas Joana vivera o drama que a fizera esconder-se.


Ficaram em silêncio. Joana fixava os olhos no sol que se começava a esconder, levantou-se, deu uns pequenos passos, voltou-se e disse:


- Luís quando é que me mostra o que já escreveu sobre “a casa na colina”?


- É fácil, como pode ver apenas tenho o título e a dedicatória. Pode ler, não perde nem um segundo, respondeu estendendo-lhe o bloco-notas.


Joana hesitou mas acabou por rejeitar o caderno, dizendo-lhe com a voz sumida:


- Vamos esquecer este momento, temos mais em que pensar e não estou muito segura de vir a gostar da sua história. Eu não lhe vou contar os segredos escritos nas paredes naquela casa. Quem sabe o Luís consiga construir uma história alegre e que retrate momentos mágicos, com muito amor.


Já chega de mágoas e de gritos de dor. É tempo de esquecer os nossos dramas e viver a vida.


 - Eu não sei como contar essa história sem a sua ajuda. Quando me disse que aquela casa tinha alma, deixou-me a vontade enorme de a contar, mas talvez você tenha razão. Algo me diz que a alma daquela casa também será a sua. E isso apavora-me, concluiu Luís com a voz tremida.


Regressaram a casa. Joana lembrou que as obras de recuperação da casa já estavam a decorrer e, talvez fosse aconselhável ver com ele se tudo responde aos seus desejos. Entretanto, com a chegada do calor de Julho que já se aproxima, começarão os trabalhos nas searas. Também para mim.


Luís sentiu que Joana lhe dizia para partir. Mas, para ele, partir era morrer um pouco.  


 

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