QUATRO SONHOS
A M O R
A CASA NA COLINA
4 -
PAIXÃO
Luís hesitou, não
sabia o que dizer, mas abriu o coração.
-“ Joana, perceba que
um homem desiludido, doente, e carente de paz interior como eu, não podia
assistir ao desmoronar dum sonho. Mas acredito que os sentimentos podem fazer
renascer a esperança, e por isso me rendo. Vou cumprir o destino que aqui me
trouxe, nesta colina, nesta casa, olhando o infinito que adivinho para lá
daqueles montes. Já agora não me chama de senhor, o meu nome é Luís. Digo que
já decidi ficar, não conseguirei viver na casa, preciso de recuperar das
emoções e esperar os arranjos que terei de mandar fazer. Até lá, ficarei
debaixo daquela árvore que já me estendeu o seu braço protetor.
-“ Aceite a minha sugestão, respondeu Joana, eu vivo na aldeia, ocupo a
casa que os meus Pais me deixaram, tenho o primeiro andar livre e ainda um
pequeno terraço. Também tenho umas vistas bonitas e o terraço pode servir para
os seus exercícios matinais, já que não há casas mais altas na cercania.
Ninguém irá reparar se está nu ou em cuecas.
Pode ficar o tempo que quiser até à conclusão das obras, na sua nova casa. Quando
o convidei não pensei em fazer negócio. Eu apenas quero ajudá-lo.”
-“Mas o seu irmão e a vizinhança acharão bem que você partilhe a sua casa
com um homem, para mais desconhecido, retorquiu Luís?”
“- Com isso não se importe, sou maior e vacinada e faço a vida de acordo
com a minha maneira de ser e não tenho de prestar contas a ninguém. Sou livre
como o vento. Respeito as pessoas, ajudo os que precisam mas mantenho sempre
alguma distância que não é preconceito, mas apenas a defesa dos sentimentos e
emoções que são apenas meus e não costumo partilhar. O meu irmão, único
familiar próximo, entendeu a minha vontade. Também ele tem casa própria, terá
amigas, nunca me disse que havia assumido algum compromisso duradouro, mas é a
vida dele. Temos de trabalhar juntos, na época da sementeira e da colheita. Mas
o trabalho é tanto, que nem dá para conversarmos.
Mas, antes de se decidir, quero dizer-lhe que o que lhe proponho é apenas
espaço físico, alguma companhia mas a Joana não estará incluída no negócio. “
Luís surpreendido com a afirmação
não soube o que dizer. Apenas agradeceu e aceitou o convite.
Em silêncio, juntaram a bagagem, carregaram o atrelado e prepararam a
descida da colina.
- “Luís, o atrelado não suporta mais peso, avisou Joana. Por isso o seu lugar
terá de ser partilhado comigo, no selim do condutor. Agarre-se bem à minha
cintura, pois não quero perdê-lo, logo a seguir a tê-lo encontrado.
A descida da encosta feita com razoável velocidade e destreza, obrigou Luís
a colar-se ao corpo da condutora. Sentiu o seu calor, há quanto tempo não
sentia o calor do corpo duma mulher, mergulhou o rosto na cabeleira farta e
respirou o cheiro a alfazema.
A motoreta parou à porta de casa, mas Luís nem disso se apercebeu. Foi
Joana quem com um sorriso irónico lhe disse:
-“Pode largar-me, já chegamos.”
Luís estremeceu, como se acordasse dum sonho, soltou as mãos, desceu da
motoreta e encostou-se à parede, pois com a descida, havia sentido uma tontura
inabitual.
“- Olhe, disse Joana, eu tenho de ir à minha vida. Vá levando as suas
coisas para o quarto do primeiro piso, será o seu enquanto quiser. Faça como se
estivesse em sua casa.
Só uma observação, dentro de casa
não existem chaves nas portas. A única que existe é a chave da rua que está
pendurada atrás da porta, mas não creio que precise de a utilizar.
Como é habitual, não sei quando irei voltar. O tempo para mim é marcado
pelo sol ou pelas estrelas, não sou escrava das horas, aliás, nem uso relógio.
Fique à vontade, em algum momento regressarei.”
Dito isto, arrancou a toda a velocidade e rapidamente desapareceu.
Luís foi transportando a sua bagagem para o quarto que Joana havia
indicado.
Estava cansado, deitou-se da cama cerrou os olhos e sonhou.
O foi um sonho lindo. O calor do corpo de Joana acendera a chama da paixão.
Era o entardecer quando Joana espreitando pela porta o convidou.
“- Suba comigo para o terraço. Eu preparei uma refeição leve e, enquanto
comemos, ficaremos olhando as estrelas.
Sentados no banco do terraço, Luís fixou os olhos na mulher que se sentara
a sua lado, não resistiu e perguntou:
“- Joana, porque me olha
assim? Se quer conhecer-me, pergunte o que quiser e eu responderei a tudo, com
a verdade, prometo.”
“- Eu não tenho dúvidas de
que o fará, respondeu Joana, mas confesso que a sua decisão de vir habitar uma
aldeia perdida no meio da planície e numa casa em ruínas, me faz pensar que,
por uma qualquer razão que não conheço, mas pressinto, não gostarei de ouvir a
sua história. Embora eu possa parecer insensível, a verdade é que, ouvir uma
história triste despertará em mim angústias e dores que tento esquecer.
Sugiro-lhe que fale com o meu irmão sobre a recuperação da sua casa na
colina.
Até lá é meu convidado.
A minha vida começa bem cedo. Percorro os campos, paro com alguma frequência
para admirar um formigueiro, uma flor. Nesses momentos encontro-me comigo,
relembro o que vivi e como vivi e faço-o em comunhão com o que de mais belo
existe, a natureza.
Quando me quiser fazer companhia, já sabe é sair pelas sete da manhã e regressar
pelas sete da tarde. O caminho é o que for. Descansaremos quando nos apetecer,
refrescar-nos-emos nalgumas pequenas albufeiras, respiraremos o ar puro e o
odor dos campos em flor.”
“- Joana a minha vida não
será um romance, aliás teria até muito pouco que contar. De qualquer modo o
destino encaminhou-me para um lugar, que me fez lembrar a minha infância com o
cheiro da terra e o brilho do sol. E como prémio o poder sentir o fascínio de
uns lindos olhos verdes.”
Joana não escondeu um sorriso leve.
Agora olhava para Luís e sentia-se inquieta, e só ao longe, como um
murmúrio ouviu que Luís, olhando no vazio, abria o coração.
Olharam-se nos olhos e num impulso Joana apertou a mão do companheiro, e
beijaram-se. Um beijo leve que rapidamente se transformou num momento de
paixão. Corpos unidos e sem uma palavra soltaram as emoções esquecidas.
Amaram-se com loucura, partilhando calor, desejo, emoções, angústias e paixão.
No cimo da colina a casa que os juntara ficara só.
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