DOR
Devo reconhecer. A minha tentativa de contar histórias foi isso mesmo, uma tentativa.
Pela minha cabeça perpassam fragmentos, pensamentos soltos, e não sou capaz de construir uma história que valha a pena contar.
Aliás tenho algum fastio, desengano e não consigo afastar os fantasmas que ocupam o meu pensamento e como um veneno insidioso me vai lentamente destruindo.
Os sonhos morreram. Em seu lugar ficou a realidade. Fria e suja, onde posso encontrar aqueles que me não despertam interesse. Nem respeito.
E os dias continuaram a sua marcha inexorável a caminho do abismo. Por cada um, juntaremos mais algumas centenas de desempregados, que se vão arrastando pelas esquinas ou nos recantos tentando ocultar o estigma da pobreza, que se cola ao corpo e corrompe a vontade.
Enquanto se esquecem direitos e se entregam vidas para que alguém possa apregoar a nobre atitude da caridade.
E as palavras soam frias como se ditas por um robot programado.
O poder apresenta-me um cálice de fel que devo beber.
Mas alguém me ajude, porque só resistirei até acreditar que ser feliz, é possível.
BELEZA
Desliguei do mundo real, dos dias de revolta e desesperança e procurei refúgio junto daqueles que nunca me traíram. Os livros das minhas memórias, os Poetas que me preencheram os sonhos.
Faço-o com certeza que as palavras terão outra beleza e, mesmo que tristes, serão sempre belas, como a poesia.
Serão momentos em que ficarei feliz. Efémeros mas mesmo assim, ou ainda assim, são a água fresca que me lava a alma.
CONDIÇÃO
Constrói ao menos
qualquer coisa efémera
Por mais não podes ser,
sê ao menos efémero
Grava os passos na areia,
desenha sobre estrada
teu vulto.
É melhor do que nada.
A desfazer-te o rastro
virá o Mar, é certo.
Virá, é certo, a Noite
beber a tua sombra.
Efémero? Serás…
Mas presente
no Mar, eternamente;
na noite, para sempre.
(CAMPO ABERTO- Poemas de SEBASTIÃO DA GAMA)
3 – SENTIMENTO
Liberto do veneno do dia a dia, e para completar o prazer que um livro de poesia me tinha dado, procurei um filme para um fim de tarde sem queixume.
E quase por acaso peguei no último DVD que me haviam oferecido pelo Natal e que esquecera. Fiquei feliz, o filme “Sciuscià" dirigido por Vittorio De Sica era um dos poucos daquele grande realizador que não me lembrava de ter visto.
E lembrei-me de um documentário assinado por Scorsese“ A minha viajem a Itália”, uma viagem pela época de ouro do cinema italiano do pós-guerra, a evocação nostálgica dos grandes filmes de Federico Fellini, Roberto Rosselini,
Vittorio de Sica e Luchino Visconti.
Mas Scorsese não mencionara este filme “Sciusciá”o que me deixou ainda mais interessado.
Mas foi uma bela surpresa. É um filme com uma bela história de amizade entre jovens, quase crianças, num Roma destruída e numa sociedade sem valores para além da sobrevivência.
Chorei no final, mas valeu a pena. Porque chorar mitiga a dor e deixa um sentimento que talvez só vendo e revendo o filme, se possa explicar.
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