quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

PALAVRAS

ILUSÃO
Abro a mão vazia, estendo-a ao meu amigo e dou o que já perdi. A ilusão.
Nada mais me resta senão alguns assomos de revolta, angústia e de dor.
O tempo não esperou que a construção do Portugal sonhado numa manhã de Abril ganhasse forma e resistência. Tudo não passou dum andaime que, ruídas todas as esperanças sobrou desenhado na memória.  
Andaime
O tempo que eu hei sonhado
Quantos anos foi de vida!
Ah, quanto do meu passado
Foi só a vida mentida
De um futuro imaginado!·
Aqui à beira do rio
Sossego sem ter razão.
Este seu correr vazio
Figura, anónimo e frio,
A vida vivida em vão.

A ‘sp’rança que pouco alcança!
Que desejo vale o ensejo?
E uma bola de criança
Sobre mais que minha ‘s’prança,
Rola mais que o meu desejo.

Ondas do rio, tão leves
Que não sois ondas sequer,
Horas, dias, anos, breves
Passam — verduras ou neves
Que o mesmo sol faz morrer.

Gastei tudo que não tinha.
Sou mais velho do que sou.
A ilusão, que me mantinha,
Só no palco era rainha:
Despiu-se, e o reino acabou.

Leve som das águas lentas,
Gulosas da margem ida,
Que lembranças sonolentas
De esperanças nevoentas!
Que sonhos o sonho e a vida!

Que fiz de mim? Encontrei-me
Quando estava já perdido.
Impaciente deixei-me
Como a um louco que teime
No que lhe foi desmentido.

Som morto das águas mansas
Que correm por ter que ser,
Leva não só lembranças —
Mortas, porque hão de morrer.

Sou já o morto futuro.
Só um sonho me liga a mim —
O sonho atrasado e obscuro
Do que eu devera ser — muro
Do meu deserto jardim.

Ondas passadas, levai-me
Para o olvido do mar!
Ao que não serei legai-me,
Que cerquei com um andaime
A casa por fabricar.

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"


E perdida a ilusão ficarão os sonhos, a recordação da juventude. E no meu caso fica a música de um filme.



JUSTIÇA
Cá nesta Babilónia
Cá nesta Babilónia, donde mana
            Matéria a quanto mal o mundo cria;
           Cá, onde o puro Amor não tem valia,
           Que a Mãe, que manda mais, tudo profana;

            Cá, onde o mal se afina, o bem se dana,
            E pode mais que a honra a tirania;
           Cá, onde a errada e cega Monarquia
           Cuida que um nome vão a Deus engana;

            Cá, neste labirinto, onde a Nobreza,
            O Valor e o Saber pedindo vão
            Às portas da Cobiça e da Vileza;

           Cá, neste escuro caos de confusão,
           Cumprindo o curso estou da natureza.
           Vê se me esquecerei de ti, Sião!

(Luís Vaz de Camões, in "Sonetos")
Justiça para os pobres, os deserdados, igual a justiça para os ricos e os poderosos. Assim devia ser numa sociedade que se tenha libertado dos seus preconceitos de classe. Mas não é assim. A Justiça não é cega e para ser JUSTIÇA, falta ser justa.
LISBOA
Todos temos lugares e cidades que nos encantaram. E que guardamos no baú das recordações.
Lisboa, cidade mágica, mulher embalada nos braços no Tejo, banhada por uma luz que nos encandeia é inesquecível.
A história mostra que Lisboa é uma das mais antigas cidades do mundo e sem dúvida a mais antiga da Europa Ocidental.
Com o rio Tejo foi porto de abrigo para os marinheiros Fenícios, recebeu Ulisses na sua viagem de regresso a casa depois da guerra de Tróia, depois as legiões de Júlio César, as invasões dos mouros do Norte de África que deixaram marcas nas pessoas e na língua Portuguesa.
 Lisboa foi sempre o ponto de partida e o ponto de chegada. Lisboa é como o primeiro amor que não se esquece.
Afinal, porque Lisboa é mulher.
Mas Lisboa é também o povo que a percorre, canta e ama. E esse Povo que vagueia nas ruas desta cidade, tem sombras no olhar, tem angústias no coração. O futuro é amanhã e nada traz de bom.
E eu, Lisboeta por adopção, sinto a nuvem negra que alastra no rosto de quem sofre a desesperança. Então subo ao castelo, ponho o cotovelo e deixo que as lágrimas lavem os meus receios.



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