CAMINHANDO
Cheios
de frio e cansados os dois irmãos, largaram o saco que transportavam às costas
e sentaram-se sem trocar palavras. Apetecia-lhes dormir mas, molhados até aos
ossos, não conseguiam.
O
irmão mais velho resmungou:
-
Isto vai acabar mal, eu não sei se consigo fazer o que prometemos. Cada vez
mais me arrependo de ter seguido. O cansaço eu sei o que isso é, o corpo
molhado e o frio não é novidade, mas agora tenho receio do que nos espera. Não
sei, não sei, por mim voltava para trás.
António fixou os olhos no irmão, abanou a
cabeça dizendo:
-
Chico, para quem aqui chegou, o caminho só pode ser um. Seguir em frente. Acredito
que estamos perto da casa que o Ernesto nos indicou. António, assumindo-se como
chefe indicou a estratégia.
-
Eu vou da frente e tu segues um pouco mais atrás, deixando sempre um espaço
entre nós. Quando eu parar e me agachar tu fazes o mesmo. Eu só entrarei na
casa se vir a luz da candeia na janela, o sinal que o caminho estará livre. Se
apesar da luz a detetar algum movimento suspeito, faço-te sinal e tu ficas
escondido. Espera uns minutos. Se eu entrar na casa e não sair para te chamar,
foge e regressa a casa. Não esperes por mim, eu tentarei fugir mais tarde.
Pegaram
nos sacos e foram-se aproximando da casa, pequena isolada na encosta da serra.
António assinalou a luz que mal se via por entre as árvores e o nevoeiro da
manhã de inverno. Que alívio, pensou, o sinal era de caminho livre. Parou,
ficou atento a algum barulho, e nada lhe pareceu estranho. Antes de nela entrar
sussurrou ao irmão:
-
Parece tudo calmo, mas nunca fiando. Vou entrar e tu espera que eu te chame. Não
te esqueças do que combinamos. Se eu não sair da casa, seja o que Deus
quiser.
Com
todo o cuidado António empurrou a porta que estava entreaberta e entrou. Viu
que no interior apenas estava um homem aquecendo-se à lareira. Perguntou:
-
O senhor é o Manolo?
Foi
com alívio que ouviu a confirmação e mais tranquilo ficou quando o camponês lhe
apontou um banco junto da fogueira. António fez apenas um gesto a pedir um
momento e foi à porta chamar o irmão.
Manolo
pegou nos sacos, saiu da cozinha, desceu um degraus e voltou com um molho de
notas que lhes entregou. E, de seguida, a mulher entrou com uma panela de sopa,
colheres e pão e todos foram comendo em silêncio.
Depois
de comerem em silêncio, Manolo avisou que ia preparar a carroça com os fardos
de palha para se meterem a caminho da aldeia de La Jola, onde o Alonso que tem
uma quinta, lhes entregaria as crianças.
-
Vocês, disse, dividem-se, um vai comigo o outro esconde-se no meio dos fardos. É
possível que encontremos desertores em fuga ou soldados da Guarda Civil. Eu
levo prendas para os comprar. Mas tenham atenção, eu não posso aproximar-me da
quinta do Alonso. Paro na estrada e indico-vos o local. O resto será entre
vocês e o Alonso.
Vamos,
o caminho, faz-se caminhando.
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