Eduardo Nery
Astros
Manufactura de Tapeçarias de Portalegre
Portalegre/Portugal
9 – DEZ ANOS DEPOIS - 2º. CAPÍTULO
Carlos perdera o contacto com o grupo de amigos, logo que deixara Lisboa e fora estudar para a cidade do Porto.
Fora-lhe difícil, ele aparentava ser distante mas era a sua própria maneira de ser. Não se dava porque tinha medo.
Essa inibição, custara-lhe o amor e a paixão que Leonor lhe inspirara desde os bancos da escola. Nunca confessou mas se os olhares fossem um livro muito teriam para contar. Carlos sonhava com a colega, admirava o seu jeito de olhar e de andar, seduzia-o o sorriso cristalino. Imaginava as palavras ternas que lhe quereria murmurar, as carícias, o contacto físico e até o cheiro.
A sua fixação naquela rapariga que conhecera dos doze e perdera aos dezassete anos, tornara a sua vida futura num deserto. Tinha vinte e cinco anos quando seguiu para os Estados Unidos a frequentar o MIT mas mesmo distante a imagem de Leonor continuava a povoar-lhe o cérebro.
Só o estudo o distraía. Tinha dificuldade em fazer amizades, naquela Escola onde um amigo podia ser um concorrente. Eram todos jovens e ambiciosos, lutavam pelo futuro que seria sempre, mais estudo, muita investigação, muitas noites sem dormir, alguns fracassos profissionais, êxitos também, mas acima de tudo, os anos que iria frequentar como preparação do doutoramento em física, seriam anos de solidão.
Conseguia dispor alguns minutos para utilizando as possibilidades da internet, falar com o Pai e a Mãe, ocultando algum desânimo. O irmão mais velho, que fizera o mesmo caminho, trabalhava agora no CERN em Genebra e também era um homem só. E quando conversavam, o irmão bem o avisava para não se deixar dominar exclusivamente pelo estudo e pela investigação. Não te esqueças, há mais vida para lá das paredes e salas do Instituto
Olha para o meu exemplo. Sou profissionalmente realizado mas não tenho vida própria.
Termina o curso e apresenta a tua candidatura se quiseres integrar a equipa do CERN. Não será fácil entrar mas a tua presença talvez me ajude a romper os hábitos de muitos anos e a respirar um pouco de liberdade.
Carlos esteve três anos no MIT, saiu com vinte e oito anos de idade.
A sua vida pessoal fora sempre um fracasso. Apaixonara-se e não fora compreendido ou aceite. Os amigos eram poucos e as colegas achavam que ele era óptimo para ouvir as histórias das suas paixões mas nunca para protagonizar uma delas.
Todavia não era um rapaz feio, mas era muto fechado. Chegara aquela idade e só não era virgem porque recorria a acompanhantes profissionais. Que tristeza de vida.
Na despedida foi convidado para jantar em casa de um professor, com quem estabelecera alguma proximidade. Aceitou.
O Professor era natural do Quebeque e tinha uma surpresa reservada. Era casado com uma Portuguesa, sua antiga aluna, natural de norte de Portugal.
Tinham dois filhos, o mais velho François, dez anos de idade ficara com o nome do avô paterno e uma menina, Beatriz o nome da Avó materna.
Carlos tímido como sempre, demorou a integrar-se no seio de uma família feliz.
Foi a dona da casa, Lúcia de seu nome, que lhe mostrou a alegria por encontrar um compatriota com quem podia relembrar os seus tempos de estudante na Universidade do Porto.
Universidade do Porto repetiu Carlos, foi aí que me formei o que quer dizer que fomos, colegas?
De facto tinham uma diferença de quatro anos, Lúcia estaria a acabar o seu curso enquanto Carlos era um caloiro, foi a conclusão a que chegaram.
Mas aquele relembrar da velha cidade do Porto, do rio e das suas gentes ajudaram a criar um ambiente informal e descontraído. Carlos sentiu o calor da amizade.
Ao jantar, o dono da casa sugeriu beberem um vinho tinto e apresentou uma garrafa de vinho português, dizendo:
- Este vinho foi-nos oferecido durante as férias, em que percorremos o magnífico Rio Douro. É o meu preferido, tem o corpo com sol, o odor das flores e a leveza dos socalcos debruçados sobre o rio. Chama-se Casa da Ribeira, não sei se conheces?
- Casa da Ribeira, mas esse era o nome da quinta onde eu passei as férias de fim do curso liceal. Éramos sete amigos e nunca mais nos encontrámos. Pegou na garrafa, o rótulo era a fotografia da casa que reconhecia e o produtor assinava Simão & Companhia.
Foi como uma luz que de repente lhe iluminou o passado. E naquele dia, no estado de Massachusetts, na costa leste dos Estados Unidos, Carlos recordou o grupo de amigos. Por onde andariam?
Foi um momento de nostalgia que breve passou. Afinal ele iria passar pelo Porto e talvez conseguisse encontrar os amigos. Ficara com essa esperança.
Fernando Pessoa
Pintura de Júlio Pomar
Biblioteca Municipal da Marinha Grande
Portugal
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