SOLIDÃO
E António sofrera.
A dor da ausência da ternura dos braços de
Marjorie, e como recordava, com uma lágrima furtiva, as noites loucas de
paixão.
Tudo se esfumara e ele fora o culpado.
Tinha-se entregue ao trabalho vivendo o dia-a-dia
com a intensidade que o fez esquecer que a mulher com quem partilhara os
melhores anos da sua vida, se cansara e partira.
Não queria acreditar que as juras de amor que
haviam trocado, se tinham perdido no quotidiano da sua vida profissional.
Foram tempos difíceis que António foi enfrentado
com a embriaguez do seu trabalho.
Tentou o contacto com a revista para onde Marjorie
dizia escrever, contando o florir dos cravos neste País triste, mas com
surpresa não obteve nenhuma pista para seguir o caminho da mulher amada. Nem o
nome era conhecido.
Tentou desesperadamente obter o apoio de um colega
da Polícia de Paris, mas faltavam-lhe dados e a boa vontade do colega não foi suficiente.
Apenas um jornalista desconhecido, lhe falou que Marjorie teria emigrado para o
Canadá.
Foram dias, meses, anos de agonia até que António passou
a pensar em Marjorie como um sonho, uma fada do amor ardente de que ele se
esquecera e deixara morrer.
E a dor da solidão ficara a sua companheira.
E trabalho funcionava como um escape para uma mente
amargurada e António deu tudo o que era capaz para levar a bom termo a
investigação dos crimes que começavam a chover em catadupa sobre a sua
secretária.
Porque as noites eram o suplício, deitava-se tarde
escrevendo os relatórios sobre o trabalho, resumindo o sucesso e os casos que
tenham prescrito, sem que ele e a sua equipa os tivessem resolvido. Não eram
muitos, era certo e a maior parte deles casos de pouca importância. Todavia um
caso em concreto lhe deu motivos para escrever longas notas.
Investigara ao longo de meses uma série de crimes
com assinatura. Conseguira perceber o móbil dos crimes, tinha fortes suspeitas
sobre os seus autores mas não conseguira reunir provas suficientes para um
julgamento. Chamou aos apontamentos “Os crimes do X”. Tinha a convicção de que
os crimes teriam sido cometidos por quem não acreditava na Justiça dos
Tribunais e decidira fazer justiça pelas próprias mãos. Ali estava um assunto
que ele gostaria de trabalhar, talvez sobre a forma de um romance, a escrever
um dia.
Guardava todos os apontamentos, todos os recortes
dos jornais e fizera algo que não faria sentido. Juntara também fotografias da
sua passagem pela guerra, algumas situações de morte, agonia e violações.
A caixa era o repositório dos seus segredos, do seu
trabalho, das suas frustrações e dos seus erros.
E durante cinco anos de solidão a caixa dos
segredos foi a sua companhia nas noites de insónia.
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