ANA CAROLINA
António sentiu que o chão lhe fugia debaixo dos
pés. Abraçado á filha, jovem de quinze anos, buscava força para retomar o
caminho.
Precisava de toda a sua energia, cada vez mais
escassa, para continuar vivendo. A filha era a razão por que teria de lutar
mas, no seu íntimo, tinha medo. Ana Carolina começou a ser a âncora que o
prendia. Estudava, entrou na Universidade com as melhores notas, foi dona de
casa, gestora dos bens e da saúde do Pai e continuava a desenhar o seu próprio
caminho.
A morte da Mãe não fora, para ela, inesperada.
Leonor fizera-a prometer que a sua doença terminal seria escondida do Pai.
- Ele tem vivido em contramão. Por entre os anos de
felicidade, alegria e amor acabou por ver fugir a felicidade. Agora será mais
um momento de dor que só tu poderás apaziguar, dissera-lhe a Mãe, meses anos de
conhecer o seu fim.
Mas, ajudar o teu Pai quando eu fechar os olhos não
quer dizer que deixes de lutar pelo teu caminho. Olha pelo teu Pai mas, não te
esqueças, olha também para ti.
E foi assim que Ana Carolina geriu o presente
imediao e lançou as pontes para o futuro.
Era muito jovem mas muito destemida e persistente.
Não deixou que o Pai se consumisse com a morte da mãe, e para tal recorreu a ajuda
médica adequada. E tudo parecia caminhar bem.
O Pai decidiu pedir a transferência da área de
investigação criminal. O frenesi com que sempre se dedicara à investigação não
seria agora compatível com a sua debilidade física e alguns momentos
intelectual.
Ganhara coragem para acompanhar o Pai no seu lento,
mas evidente declínio, mas a um preço elevado. Iria abdicar do caminho que
havia sonhado, esqueceria os seus projetos de futuro no campo da investigação
apesar de ter sido convidada a frequentar um mestrado em Nova Iorque.
Mas agora, iria esquecer, apagar os sonhos e
regressar ao quotidiano de tantos jovens como ela. Seria mais uma licenciada
lutando por encontrar trabalho.
E o seu
futuro foi o assunto da conversa que o Pai, numa noite de início de Outono, triste
e chuvoso, aparentando alguma recuperação, olhando com ternura para a filha que
se ocupava das lides domésticas, começou:
- Minha filha, eu devo-te muita da força que ainda
sinto. Tu tens sido a luz que me tem guiado e agora, é tempo de retomares o teu
sonho. Eu vou-te exigir que o faças.
Conta com a ajuda do Pai. Escolhe o caminho e eu
estarei a teu lado.
Eu sei que passaram longos meses que para ti foram
também muito difíceis. Perdeste a Mãe, companheira e eu não fui capaz de te
ajudar. Perdoa-me.
Agora sinto ter forças para viver porque sei que tu
onde estiveres te lembrarás de mim como eu me de ti.
Carolina, surpreendida com a proposta do Pai,
esboçou um gesto de recusa mas, mas abraçando-se ao Pai, sentiu o bater do
coração e reconheceu que para ela e para ele, a vida teria que continuar.
Acabou por exigir que, ela apenas iria para Nova
Iorque, desde que o Pai aceitasse ser acompanhado por alguém de confiança.
Sugeriu uma senhora, mãe de família, vizinha e amiga, antiga professora, que
conhecia desde os bancos da escola. O Pai aceitou.
E Carolina partiu, cheia de dúvidas mas prometendo
a si mesma que a qualquer sinal voltaria a casa.
E ao despedir-se no Aeroporto, depois de terem combinado
os contactos, Carolina sentiu que a força do abraço do Pai era mais do que uma
despedida e tremeu. As palavras que o Pai lhe murmurava ao ouvido eram ditadas
pela dor dum homem que teria deixado de encontrar uma razão para viver, pois,
dizia-lhe:
-Não é uma despedida, é um até breve. Volta um dia feliz
e realizada e com o tempo, toda a amargura, todo o desencanto, todo o
sofrimento, toda a dor, irá desaparecer.
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