3 - UM PERFUME FRANCÊS
MARJORIE
Nascera de um casamento improvável. O Pai,
professor, austero e conservador nos costumes e na política e a Mãe estudante
de filosofia, fez parte do movimento estudantil que abanara a França nos anos sessenta.
Marjorie cresceu assim num ambiente familiar frio e cheio de contradições. E foi isso que
moldou a sua forma de estar perante a vida e as pessoas que se cruzaram no seu
caminho.
Andou perdida na Universidade. Experimentou cursos
técnicos que detestou e depois de mais algumas tentativas acabou por escolher, e
com entusiasmo, a carreira de jornalista.
Quem diria, comentavam os amigos. Uma rapariga
bonita, interessante, criada no meio da alta burguesia de Paris escolher como
caminho, acompanhar o mundo em constante evolução, conflitos, revoluções,
afinal, perigos que uma mulher jovem não estaria preparada para enfrentar.
Marjorie deixou-se influenciar por jornalistas mais
experientes que lhe contavam episódios, alguns que até haviam custado a vida ou
a sanidade mental dos que os viveram. Ficava extasiada a ouvir contar
reportagens sobre a guerra no Vietnam e, mais próximo a tragédia na guerra da
independência da Argélia e do terramoto político que a descolonização haveria
de causar no seu País.
Nos meios que também frequentava, encontrou jovens emigrantes Portugueses que haviam abandonado o País, fugindo da guerra colonial. Aprendeu
que muitos dos jovens que conhecera, cantores de intervenção, refugiados
políticos, sonhavam com um País de luz, sol e mar, livre das grilhetas da ditadura.
E foi no Abril de 1974 que à jovem repórter
Marjorie foi distribuída a tarefa de relatar aos leitores do jornal, a
liberdade que surgia no horizonte dum Povo triste.
E a sua vida nunca mais foi a mesma.
A revolução dos cravos que os Portugueses viviam
com entusiasmo e esperança contagiou-a e decidiu ficar por Portugal.
Fez amigos, participou no despertar dum Povo
oprimido. Ouviu e leu os Poetas, ouviu e aplaudiu os cantores, acompanhou os
soldados.
Conheceu um jovem oficial que regressara da guerra.
Chama-se António e era na altura finalista do curso de Direito da Universidade
de Lisboa. Conheceu-o e começou um grande amor.
Entregaram-se à paixão que os unira e não quiserem
discutir, sequer, o futuro. António ingressou na Polícia Judiciária e o mundo
em que mergulhou, tempo de desespero, tempo de ódios e de crime, afastou-os. Marjorie
sentiu-se uma peça quebrada da engrenagem em que o companheiro se deixara
envolver. Partiu com uma ferida no coração e o futuro no ventre. Numa carta que
deixou, contou a mágoa de um amor traído. Mas no afinal, também reconhecia que
o amor murchara como os cravos da revolução de Abril e pedia para que ele a
esquecesse. Ela seguiria o seu caminho e cuidaria do filho que levava no
ventre.
A carta terminava: “ NON, JE NE REGRETTE RIEN”.
Sem comentários:
Enviar um comentário