quinta-feira, 16 de abril de 2015

A CASA NA COLINA











PARA ALÉM DA SAUDADE


 


Passaram mais uns minutos, ouviu o abrir duma porta, mesmo ao seu lado. Um homem saiu, pendurou uma proteção de fitas coloridas contra as moscas e virando-se para o desconhecido disse:


-Vossemecê quer alguma coisa do meu estabelecimento? São horas de abertura, é só entrar e escolher, porque aqui não falta nada, e o que não houver hoje, posso garantir que será entregue amanhã à tarde, disse-lhe um homem ainda novo, e que pelos vistos, era o dono da mercearia.


Aliviado por encontrar alguém, Luís esboçou um sorriso e respondeu:


- Sabe, eu estava era admirado por não ver ninguém. Até pensava que me tinha enganado no destino. Eu ainda não sei do que vou precisar. Primeiro terei de chegar a casa, arrumar as minhas coisas ver então o que me faz falta.


-Então é o senhor o novo dono da casa da colina?


- Sim sou. Queria um lugar isolado, onde pudesse encher os pulmões de ar puro e beber a paisagem. Não encontrei nada melhor e por isso aqui estou, contente, mas embaraçado com tanta bagagem que não sei como transportar.


- Lá isolada a sua casa é. Respirar ar puro e admirar a paisagem também lhe vai ser fácil, mas a casa está desabitada há muito tempo, poderá encontrar algumas limitações ao conforto em que terá vivido. Nada, porém, que não possa ser resolvido. Mas, acredite o que lhe digo, os primeiros tempos não serão fáceis. O acesso também não o será, pois se bem me recordo, existe apenas um carreiro, que deve estar em mau estado, e que era utilizado, por uma carrocita pequena, puxada por um burro, quase tão velho como o casal que lá habitava, e lá morreu. Não o quero desmoralizar, o sítio é muito bonito, de verdade, mas também vai encontrar dificuldade, que não previu. Por exemplo o abastecimento. Aqui não há rede de telemóvel. A energia elétrica está desligada à tanto tempo, mais de cinco anos, que terá que ser feita a sua revisão. O abastecimento de água é feito de um reservatório no telhado e, naturalmente deverá se limpo e testado.Terá a solidão como companheira. Para qualquer coisa que precisar terá que contar comigo. E apenas lhe posso garantir que, pela manhã eu ou o meu ajudante, passaremos pela sua nova casa. Pode contar com a ajuda possível. Mesmo hoje, para o ajudar a transportar as suas coisas, irei precisar da minha motoreta e do atrelado, pois não me atrevo a utilizar a carrinha de caixa fechada com que me desloco.


Mas espere mais um pouco, logo que o rapaz que me ajuda na loja se digne aparecer, faremos a mudança.


- Oh meu amigo, nem imagina o meu alívio. Por isso esperarei o tempo que for preciso. Na verdade, talvez eu tenha sido imprudente ao escolher a casa, como o refúgio que precisava para descansar, mas agora não me resta outra alternativa que não seja a de contar com a sua amabilidade e simpatia. Por isso lhe agradeço e esperarei o tempo que for necessário.


- Então eu já volto. Já agora apresento-me:


O meu nome é Manuel Carvalho e aqui nas redondezas toda a gente me conhece pois, além de comerciante, sou também o Presidente da Junta da Freguesia em que esta pequena e quase esquecida aldeia está incluída.


 


Luís respirou fundo e recostou-se no assento. Finalmente a aventura estaria a ter sentido numa altura em que ele já sentia alguma desalento.


 


Entretanto, começou a notar algum movimento na praça, meia dúzia de pessoas que regressavam a casa depois de um dia de trabalho no campo e dois homens, já trôpegos que aparando-se aos cajados, caminhavam na direção do banco que ele ocupava. Luís apressou-se a afastar a bagagem para libertar lugar para os seus novos companheiros.


Perante o olhar intrigado dos velhotes, Luís feliz por ter encontrado companhia saúda-os com um sorriso, desejando-lhe uma boa tarde.


Os velhotes olharam com desconfiança para o forasteiro, e Luís apresentou-se:


- Não se admirem, sou o vosso novo vizinho, e vou morar na casa na colina.


Os seus novos companheiros não mostraram qualquer emoção, murmurando apenas um cumprimento que Luís nem percebeu. Coitados, pensou enquanto os olhava com mais atenção. Viu homens cansados, de olhos mortiços e faces descarnadas, como se aguardassem o fim.


 Ficou impressionado, não deixou de pensar se aquele retrato seria o seu espelho no futuro não muito distante. E tremeu.


Salvou-o dos pensamentos, o ruído estridente de um motor. Era o amigo Manuel Carvalho que se aproximava, montado na motocicleta, ligada a um pequeno atrelado, dizendo:


- Vamos embora amigo, vamos lá subir a encosta. A casa na colina espera por si.


Enquanto o seu recente e prestável amigo enchia o atrelado com a bagagem Luís olhou de novo para os velhos habitantes que já conhecera, começou a recear que, para além da saudade que não morrera. A aventura que ia iniciar lhe poderia trazer mais dor e sofrimento. A solidão mata e ele já fizera uma parte do caminho.


 


 


 


 


 









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