Pintura de Graça Morais
Tapeçaria de Portalegre
CAPÍTULO V
Já o previa. O crime do Guincho seria apenas a parte visível de uma história bem mais complicada. Pedro gostava de desafios, saíra-se bem até aquele dia, mas este caso aparentava ligações perigosas. Estaria perante profissionais, que executariam ordens de uma estrutura mais escondida. Tinha essa convicção, sentia a adrenalina aumentar,mas tinha que começar quase do zero.
Tinha um corpo por identificar e dos assaltantes que foram envolvidos para desviar suspeitas um, talvez o mais importante, estava morto.
Pedro regressava ao gabinete, de transporte público e aproveitava esse tempo para recapitular.
Luís Tavares, o assaltante ferido estaria a falar verdade, dali não esperava saber mais nada. O Fernando assistira a qualquer coisa que o assustara. Porventura ter-se-ia apercebido que estava a ser conduzido para uma armadilha perigosa. Pressentiu ou viu algo que não devia, sentiu-se em perigo e conseguiu fugir, levando o companheiro. O acidente não fora um mero despiste, Fernando morrera em consequência do despiste, mas estaria condenado. O acidente apenas fora um acaso que servira aos envolvidos na trama. Mas que trama?
No gabinete já tinha o relatório do Laboratório. Apenas a confirmação que o envelope não tinha impressões digitais precisas e que os CD virgens, nunca tinham sido utilizados e que o CD do filme era mesmo uma cópia caseira, feita de um site clandestino, muito procurado por quem se dedicava a piratear filmes, principalmente para crianças, era o disfarce, mas na realidade contendo filmes para adultos. Nada de especial fora encontrado. Todavia o computador utilizado para copiar o filme não era um computador portável e pessoal. O técnico garantia que seria um computador ligado a um servidor, o que sugeria ter sido feito por alguém que trabalhava numa empresa com serviços informáticos, ligados a um computador central. Dava como exemplo uma Repartição Pública, um Banco ou uma Empresa prestadora de serviços.
O especialista, continuaria a tentar encontrar algum traço que pudesse seguir, até ao computador principal. Mas seria um trabalho difícil e com poucas garantias de sucesso.
O relatório da autópsia era mais preciso.
Pedro leu apenas as conclusões. O corpo apresentava ferida de bala no maxilar direito, a bala tinha sido retirada e o calibre era de 9mm. Uma arma de guerra, murmurou Pedro. E continuou lendo. O cadáver apresentava equimoses nos pulsos, bem marcadas, dando ideia de ter estado amarrado durante bastante tempo.
A hora da morte fora calculada entre as dezassete e as vinte horas.
Com toda a informação memorizada e com uma cópia do croqui do local onde o carro com a vítima fora encontrado, Pedro decidiu ir ver o local.
Ficava relativamente perto de um restaurante ladeado por uma área de areia, com arbustos em redor,que funcionava como parque de estacionamento. No restaurante não havia muito movimento, meia dúzia de carros parados e um guarda sentado numa cadeira, com o boné com o nome do restaurante.
Pedro dirigiu-se ao guarda e desafiou o guarda para uma conversa sobre o movimento daquele dia.
O Senhor Manuel não se fez rogado e confessou que o dia não estava a correr muito bem e até alguns clientes habituais ainda não tinham aparecido. É a crise, dizia ele.
Pedro acenou com a cabeça e olhando para as arribas onde o carro com o cadável tinha sido encontrado lembrou:
- É a crise, tem razão senhor Manuel, até não se vêm os carros que ali costumavam estar estacionados a ver o mar.
- A ver o mar, aquilo são namorados e olhe que costumam ser bastantes. A semana passada, durante uma tarde, contei oito, mas ontem e hoje nem um, Sabe porquê?
- Não, não faço ideia, será da crise, e riu!
- O senhor não brinque, agora não têm aparecido tantos clientes porque esteve aí a Polícia e encontrou um carro com um homem morto. O senhor percebe, se aparece a Polícia os frequentadores daqueles locais desaparecem.
- Agora me lembro que ouvi falar desse caso. E o senhor Manuel não viu nada fora do normal?
- Sim, eu até comentei com um empregado o Jerónimo, que nunca tinha visto tantos carros encostados. Eram três. Depois dois saíram e mais tarde chegou um outro que estacionou ao lado. Passou pouco tempo, eu vi um homem a correr, ouvi um carro a arrancar e mais nada. Só soube do homem morto no carro que ficou, quando a Polícia aqui apareceu.
Entretanto do restaurante saíram dois casais que se dirigiram para o carro e o senhor Manuel lá foi a correr para ajudar a manobra e receber a gratificação.
Pedro aproveitou e foi caminhar ao longo das arribas, olhando para as marcas dos pneus e para os arbustos. Não procurava nada de especial mas quando regressava do passeio, viu qualquer coisa que brilhava nas escarpas. E foi remexer. Do bolso retirou um par de luvas, um saco de plástico, pegou no que achara, esboçou um sorriso e caminhou para o carro. O senhor Manuel estava por perto, assistiu a tudo e comentou:
- Então senhor Inspector, encontrou o que queria?
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