sábado, 10 de dezembro de 2011

UMA NUVEM NEGRA

                                                             Edvard Munch

Era um sexta-feira no final de mês de Outubro do ano 2010. O dia estivera chuvoso triste e frio mas no final da tarde o sol conseguiu romper as nuvens e começou a descer no horizonte, escondendo-se por detrás do mar azul e revolto.
O vento soprava de norte e ao longe, por sobre a serra de Sintra e Bernardo, sentado ao volante do seu automóvel, deu pela aproximação duma nuvem negra, que lentamente se deslocava tingindo de escuro a encosta da serra.
Bernardo parou o automóvel num carreiro perto da estrada para o Guincho. Era o único carro à vista para os automobilistas que circulavam na estrada, e que para ele olhavam com um sorriso.
Não era surpresa ver um carro imobilizado naquele promontório. Era um lugar escolhido para encontro de namorados.
Todavia naquela tarde, quase perdido naquele local pouco acessível dentro do carro não estava um casal apaixonado.
Estava Bernardo, só com os seus pensamentos, as suas amarguras e o seu desespero. Só, apenas acompanhava a beleza do sol que se escondia.
Um condutor circulou lentamente pela berma da estrada afrouxou para dar uma espreitadela. Olhou para o amigo do lado e entenderam-se. Conseguiram ver que dentro do carro apenas estaria uma pessoa que, fumava cigarro atrás de cigarro. Não viram mais movimento e acabaram por parar longe, mas de maneira que pudessem vigiar o movimento do ocupante da viatura.
Eram dois homens, jovens de ar suspeito e a sua presença ali não era fortuita ou sequer ocasional. Andavam por ali, procurando um casal pouco previdente, que pudessem assaltar sem correr risco.
Era a sua forma de agir, já tinham sido identificados pela Polícia mas não desistiam. Trocavam de carro, roubado nas ruas de Cascais, e conseguiam despistar a Polícia.
Aquele carro isolado podia ser um alvo fácil. Esperaram que o sol se escondesse.
E o sol foi descendo e a nuvem negra começou a fazer pairar a sombra sobre o mar azul.
De repente o condutor do automóvel que vigiavam, abriu a porta e saiu para fora.
Deu alguns passos na direcção das rochas onde as ondas se desfaziam, parou acendeu mais um cigarro, que fumava lançando o fumo em espirais que se iam diluindo no ar.
Bernardo acabou o cigarro, virou-se e ficou de frente para o automóvel dos assaltantes, parado alguns metros além. Não fez um gesto sequer, olhou como se não tivesse visto, acendeu novo cigarro e entrou para o carro. No mesmo momento o sol escondera-se e a nuvem negra tomara conta do lugar.
Luís e Fernando, os assaltantes tiveram medo. Qualquer coisa lhes dizia para fugir. Ligaram o motor, engrenaram a marcha a trás para retomar o caminho principal e ao passarem mais perto do automóvel ouviram um ruído seco, que já conheciam. Ouviram um tiro. Aceleraram e fugiram.
No carro, Bernardo havia decidido mergulhar na noite, e com um lágrima furtiva, encostou a pistola no peito e disparou.
A cabeça caiu sobre o volante e premiu o cláxon. O som estridente, parecia um grito de revolta e dor, rompeu a quietude do local e tocou, tocou até que de repente se calou. Como a vida do Bernardo, também o grito se esgotara.


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