Renato Torres
Concerto de Orgão
MANUFACTURA DE TAPEÇARIAS DE PORTALEGRE
CAPÍTULO XVI
O dia dos dois colegas começara bem. Tinham informações e documentação para elaborar o relatório. Escolheram o hotel do Pedro, estava mais perto e era menos conhecido, encerraram-se no quarto analisando os dados que haviam coligido e fizeram um relatório preliminar, que depois de lido e corrigido duas ou três vezes, acabaram mandando para a Direcção Central.
Tinham escolhido o caminho e estavam em condições de requerer a detenção de pessoas envolvidas no tráfico de droga, fuga de capitais e outros ilícitos criminais.
Solicitaram a aprovação da Direcção e o acordo da Procuradoria de Justiça para a conclusão das investigações.
Entretanto foram vigiar o apartamento onde sabiam estar a Luísa Maria, uma das peças chaves do mistério. O Mercedes preto estava estacionado numa rua paralela mas a pouco distância das traseiras do bloco de apartamento.
Ficaram de vigília.
No que se referia ao crime de morte no Guincho, as peças estavam ajustadas e tudo apontava que a morte fora executada pela Luísa Maria e o seu cúmplice, que não era seu irmão mas sim seu amante, como disse a colega do Banco que Carlos convencera a falar.
No entanto ambos estavam de acordo que o planeamento do crime e as provas plantadas no local assim como a estratégia de contratar dois conhecidos assaltantes para serem os principais suspeitos, teria sido trabalho de um cérebro habituado a montagem de operações delicadas, atento aos pormenores, capaz de eliminar pistas e permanecer afastado, e isso só estaria ao alcance do Dr. Bernardo.
Parte do plano correu mal. O assaltante que haviam contratado no Estoril para ser incriminado desconfiou, fugiu com o companheiro, mas viria a morrer durante a fuga, num despiste de automóvel.
O casal que tinha montado o cenário, teve de improvisar, recolher a pistola, plantar as provas que serviriam para desviar a investigação para outro tipo de crime.
Estiveram hospedados num hotel da linha. A Luísa Maria recriou uma personagem, uma viúva abandonada e com filhos e reconheceu o corpo do marido.
Funcionários do Banco confirmaram ao Carlos que o Dr. Bernardo era cliente assíduo e detinha um cofre alugado em seu nome pessoal. E que dois ou três dias depois do crime do Guincho ele estivera no Banco, tivera acesso ao cofre e saiu dizendo que iria fazer uma viajem.
Pedro e Carlos elaboraram uma tese que apontava que o Dr. Bernardo se teria apropriado de fundos e estaria a ser perseguido por gente ligada ao mundo do crime. Sabia que desaparecer não seria suficiente e encenou a sua morte.
Tinha um colaborador de confiança, que também recrutara no mesmo Banco e foi ele a vítima escolhida. O Banco entregara um dossier com o nome de David Ferreira, quarenta anos de idade, solteiro, natural de Braga e residente num condomínio da cidade de Gaia. Por ironia ou talvez não, o corpo do David Ferreira acabara sepultado na sua terra de origem mas sob o nome de Bernardo Augusto Esteves dos Santos, o nome do seu patrão.
Foi já de noite que receberam o acordo. Um Procurador do Porto estaria com eles, acompanhado pelo Inspector Ramires e Agente Delgado, da Directoria da PJ no Porto. Esperariam pelas oito horas da noite para entrarem no domicílio. Olharam um para o outro, encolheram os ombros, tinham que passar a noite em vigia.
Depois foi a identificação dos moradores no andar assinalado, Luísa Maria, de novo com o cabelo pintado de negro e do companheiro, Rodrigo Morais e a sua detenção para posterior apresentação ao Juiz.
Foi também na sua presença que a Polícia identificou as malas de viajem já prontas. Numa delas encontraram uma caixa com um valor importante de dinheiro.
Estavam a preparar a fuga, mas rasto do Dr. Bernardo não encontraram nada.
Pedro e Carlos regressaram a Lisboa, o assunto seria agora seguido pelos colegas do Porto.
A meio da viajem de comboio. Pedro acordou o colega que dormia descansado dizendo:
- Carlos, tenho a sensação de que o Bernardo comeu as papas na cabeça da ex-mulher e do amante. Eles serão condenados e ele andará por algum sítio paradisíaco, utilizando o nome de David Ferreira a viver à grande.
- Pois é e até acho engraçado. A mulher chorou nos braços do amante e ele estará feliz da vida.
- Sim e se tiver juízo duvido que alguém o venha a identificar. Quem havia de dizer.
Com aquele aspecto de homem sério enganou meio mundo. E a nós também, rematou Pedro.
- Olha proponho que no nosso currículo a investigação fique registada como o caso da Nuvem Negra. Não sei porquê, mas andámos também perdidos no nevoeiro, gracejou Carlos. Fechou os olhos e continuou a dormir.
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