quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

O TEMPO DOS PRODÍGIOS - FINAL

2009 /2010
Foi-me difícil escrever sobre este período, os dois últimos anos da primeira década do segundo milénio.
Escrito assim, com esta inarrável presunção, até poderá parecer que os frutos, os textos anteriores, teriam tido algum conteúdo excepcional. Mas o que escrevi foi o resultado de memórias que guardei, dos livros que li, das lições que fui aprendendo e das dúvidas que nunca esclareci.

Escrevi sobre este biénio, mas apaguei com toda a raiva que sentia e que fora acumulando ao longo do tempo dos prodígios.
Resolvi parar, tentando uma saída. Mas ao recomeçar as palavras eram mais amargas, sabiam a desilusão, revolta e amargura.  
 Sentia que falar sobre aqueles anos seria como se tentasse ultrapassar um obstáculo e que na hora da verdade me faltariam as forças. E foi isso que aconteceu.

De facto foram anos difíceis do ponto de vista pessoal. O ano de 2009 foi o ano do purgatório e 2010 a ameaça do fim. Mas reconheço que foi naqueles momentos difíceis que me fizeram encontrar um novo alento, uma forma de soltar os desejos adormecidos, que para o bem ou para o mal, soltei para olhar um espelho e encontrar um amigo e para olhar o mundo com alguma esperança.
Decidi que, já que a memória me atraiçoou, o mais prudente seria omitir os factos relacionados com a força da Mãe natureza, já que só tremores de terra foram vários.
Fazer por esquecer a destruição da vida de muita gente, apanhada nesse tsunami financeiro com epicentro em Nova Iorque mas que depressa atravessou o oceano Atlântico, trazendo desemprego e pobreza para muitos e muito dinheiro para alguns.
Esquecer porque queria gritar a minha indignação pela ignorância e falta de valores dos líderes Europeus e a sua frieza; Essa ignorância histórica fez surgir as manifestações de egoísmo e de xenofobia, que destruíram a ideia de um espaço comum e lançou os germens da desconfiança entre os bárbaros do norte e os povos do Mediterrâneo, berço da civilização moderna.
Abriram-se feridas que nunca mais serão esquecidas.
E o sonho duma Europa morreu, afogada nos inúmeros gabinetes onde uma miríade de homens e mulheres, fingem trabalhar, mas se limitam a aguardar pelo “ditact” alemão.  
Foi com frenesim que procurei alguma coisa de que valesse a pena recordar e me devolvesse a coragem. Mas tive vergonha porque de recordações restou apenas a memória de gente que partiu e de quem aprendi a gostar. Ficou a saudade.
Em 2009:
 - Maurice Jarre





-  Michael Jackson,






- Mercedes Sosa




- Pina Bausch







E portugueses que com saber e talento me deram muitos momentos de felicidade.
A ver cinema para além do ecrã, JOÃO BENARD DA COSTA


E a rir ou a chorar com o talento de RAUL SOLNADO.


E também em 2010 ficamos mais pobres.
Morreu o  cineasta Eric Rohmer , que me traz à memória um excelente filme” A minha noite em casa de Maud”

E o realizador italiano Mario Monicelli, o filme da sua vida, um suicídio saltando de um quinto andar do Hospital onde a ninguém lhe deu a mão para encontrar uma morte assistida para uma doença terminal e que os seus mais de noventa anos mereciam.

E é com cinema, do melhor, que termino.
O filme “Crazy Heart” e um grande actor, Jeff Bridges

Coração Louco, foi a melhor maneira de terminar esta minha aventura pelo tempo dos prodígios.


sábado, 8 de dezembro de 2012

O TEMPO DOS PRODÍGIOS

2008
Foi um ano inesquecível, mesmo exemplar para os seguidores da teologia da prosperidade, porque assentou num princípio caído dos céus. Seria o ano dos milagres financeiros, suportados pela ideia de que o dinheiro era algo de mágico. Com um estalar dos dedos e todos ficavam ricos. Todos, menos os habituais 99%. Para eles ficaria sempre a caridade.

E tantas esperanças. O ano assinalou uma data premonitória. O aniversário de 2000 anos da dinastia XIN. O império do meio crescia e nele convergiam todos os recursos disponíveis.
Foi além  disso o ano do sapo, da batata, do planeta terra e do diálogo intercultural. Também foi o ano internacional do saneamento. E que saneamento!!!

Em pleno verão, os incautos, os mais crédulos, os que haviam tentado amealhar para os tempos difíceis, viram a ameaça cair sobre os seus investimentos, os seus seguros, as poupanças de uma vida, sem aventuras, tendo escolhido para as suas economias os Bancos com melhor notação financeira e as seguradoras classificadas com notação à prova de bala. Tudo tremeu e o mundo ficou mais instável.


Os deuses deviam estar loucos!
De repente no meio do turbilhão das notícias, as pessoas que começaram a ouvir falar em gestores de sociedades de investimento de novo tipo, chamadas “hedge fund”, com práticas agressivas e arriscadas, recearam pelo seu dinheiro. Aprenderam novos termos, abriram os olhos e entenderam que as suas economias haviam sido aplicadas em operações de produtos derivados que não sabiam exactamente o que seriam. Os jornais da especialidade começaram a denunciar e a utilizar chavões que pouco lhe diziam, como  “short selling”, “leverage”,"warrants", " public debt"  e os pobres e inocentes desconfiaram que o seu dinheiro havia sido aplicado em operações de especulação nos mercados da dívida e que, afinal, haviam comprado produtos derivados, de rendimento assegurado segundo os analistas, mas que eram apenas peças soltas de um edifício em ruínas, suportado em contratos de compra e venda de propriedades, que desvalorizavam hora a hora até terem atingido o valor real  próximo do zero.
A bolha havia rebentado e no meio da confusão ficaram os imprevidentes, alguns conformados, mas que  reconheceram que tudo o que lhes havia sido prometido pelo seu corretor, se resumia numa simples frase” FORAM ROUBADOS”.

Mas também tiraram lições. Quando alguém ganha na bolsa do outro lado haverá alguém que perde. Mas havia excepções e então perceberam que os Gestores em quem confiaram haviam manipulado o mercado, falsificado relatórios e tendo recebido como prémio de desempenho enormes remunerações. Esses nunca perderam.
A actividade financeira estava completamente desregulada, controlo era coisa que só atrapalhava. As Agências de notação financeira continuavam a classificar como sem risco, investir em Bancos quase falidos, sociedades sem futuro, fazendo justiça ao seu papel de alavancarem o valor dos produtos tóxicos que era preciso vender.

Apesar de alguns esforços desesperados que se revelaram inconsequentes, a falência do Banco Lehman Brothers foi seguida, no espaço de poucos dias, pela falência técnica da maior empresa seguradora dos Estados Unidos, o grupo AIG. O governo norte-americano, que defendia as “soluções de mercado” ficou alarmado com o risco sistémico e numa operação desesperada resolveu, em vinte e quatro horas, injectar oitenta e cinco bilhões de dólares de dinheiro público na AIG para salvar as suas operações.
Foi, como vai sendo habitual, o dinheiro público, o dinheiro dos contribuintes que foi utilizado para defender as grandes interesses. Era preciso salvar o capital.



E Nova Iorque, a cidade que nunca dorme pareceu vazia e destruída. Wall Street, habituada aos carros Europeus de topo de gama, aos apartamentos luxuosos, aos corretores vestidos em lojas de marca da quinta avenida, as companheiras vestidas de luxo, as escapadelas para fins de semana nos Hamptons, era agora uma rua quase deserta. E pude testemunhar no final do ano de 2008, agonia da cidade dos sonhos.
E na Europa, hoje todos conhecemos que a solução foi copiada. Ajudar os Bancos com dinheiros Públicos.

O colapso das Instituições financeiras sugou os recursos disponíveis e a economia desapareceu. O desemprego atingiu proporções que não se admitiam como possível. E que ainda hoje é uma chaga que envergonha o mundo.
O caos fez aparecer os esquemas organizados de empréstimos em pirâmide, copiando o conhecido esquema de Ponzi. O grande financeiro Bernard Madoff, foi para a cadeia acusado de ter burlado os seus clientes em centenas de milhões de dólares. Teve todavia algum tempo para por de parte algum pecúlio para os anos difíceis. Mas para quem foi condenado a 150 anos de prisão não deverá ser ele a gozar o tesouro escondido.

Sorte diferente tiveram os burlões que num pequeno e pobre País, constituíram entre amigos e correligionários, um Banco, o banco BPN, que cresceu com base em gestão danosa, fuga de capitais, lavagem de dinheiro, financiamento de favores e tornou ricos, gente que não tinha onde cair morto.

Mas deu para tudo, o BPN custará mais de cinco mil milhões de Euros, que o Zé Povinho terá que pagar. À boa maneira Nacional, o CEO está preso, mas em casa, aguardando, como é habitual, a prescrição do processo. Os outros e tantos e tão conhecidos são, navegam pacientemente em águas calmas, certos de que a investigação não levará a condenação alguma. São gente avisada e bem relacionada. A Justiça está atenta, orientada para os roubos de caixas multibanco, os furtos em supermercados e outro tipos de crime que não darão muito trabalho a investigar. Os tubarões mergulharam em águas mais profundas levando com eles os seus negócios escuros, os esquemas de lavagem de dinheiro, devidamente apoiados em escritórios de advocacia, especializados no planeamento fiscal.

Depois deste folhetim que importância iremos dar ao que mais aconteceu?
Nada tem relevância. A terra continua a girar à volta do sol e a dor, o sofrimento e a revolta acabarão por esmorecer no meio da mediocridade que, sem saber como, governa este mundo.
Apenas quero realçar como facto digno de registo. A eleição para a Presidência dos EUA. Os Americanos decidiram acordar e passar guia de marcha ao irrelevante Presidente Bush e escolheram, pela primeira vez na sua história, um negro para ocupar a Casa Branca.
Em jeito de conclusão direi apenas:

Seja Bem-Vindo Presidente Obama, a este mundo cada vez mais louco.
Mas será que este mundo ainda é belo e cheio de esperança?