terça-feira, 20 de agosto de 2013

VIAGENS AO MUNDO DOS SONHOS


DIA DE FESTA

 

Hoje não vou falar de sonhos.

Hoje dia 20 de Agosto, vou falar de  pessoas. De uma pessoa que convive comigo todos os dias e as noites, que chora e ri, que sonha e não se esquece da vida.

 Certo que não tenho a certeza de a conhecer em toda a sua dimensão, pois muitas vezes o seu pensamento até a mim me surpreende.

É uma pessoa singular, aquela que naquele dia, muitos anos atrás, abriu os olhos e chorou.

Bom sinal, disse a velhota que se encarregava de assistir aos partos, logo após ter cortado o cordão umbilical.

Talvez à experiente parteira tivessem tremido as mãos, reumático certamente, pois para que a criança que naquele dia, pelas nove horas da manhã, se amamentou do leite da sua mãe, ficou de tal maneira ligada que sofreu na vida as dores e as alegrias da Mãe, como se o cordão umbilical os tivesse mantido unidos pela vida fora, enquanto a partilharam.

E a criança que nasceu naquele verão do ano de 1942, é hoje um velho que vive dos sonhos.
Mas que hoje é um homem feliz,  recebe com emoção o amor da mulher e companheira de uma vida e do filho que é o seu orgulho.

Porque hoje é dia de festa!
 

Ele o irmão do meio, ouvirá as palavras bonitas das Irmãs, das afilhadas, sobrinhos e seus descendentes, porque aquele dia, aquele verão de 42 foi o início da viagem.

E beberá o vinho saudando ao outros familiares que vivem no outro lado do mundo;

E lembrará os amigos que resistem, tanto tempo passado. Mas a amizade não tem tempo.

Para recordar, dará um pequeno (?) salto para o ano de 1971, em que foi produzido o filme “ O Verão de 42”. Sim aquele verão foi o argumento de Herman Raucher, para a realização de Robert Mulligan e com a bela música de Michel Legrand.

Como é que ele podia esquecer?

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

VIAGENS AO MUNDO DOS SONHOS


ANATOMIA DUM PESADELO

O suor escorria pelo corpo deitado na cama. Era um suor frio que gelava o corpo e a que não conseguia resistir. Sentiu um leve ruído de passos de alguém que se aproximava e tentou abrir os olhos e encarar a figura que adivinhava, se estava a inclinar sobre o seu corpo. Mas os olhos ficaram cerrados. Queria afastar a sombra que pressentia, mas ficara imóvel, as mãos não respondiam ao apelo do cérebro e as pernas estavam paralisadas. Deixou de lutar e aguardou o seu destino.

Até que a campainha do despertador soou no silêncio do quarto, e lhe afastou as nuvens em que sentira perdido. Respirou fundo, afinal fora apenas um pesadelo.

Mas já não conseguiu voltar a dormir. Não era habitual sofrer aquele tipo de sonhos e acreditava que aquele teria de ter alguma razão. Precisava aclarar as ideias e descobrir a anatomia do pesadelo que lhe roubara uma noite tranquila.

E de repente foi-se lembrando.

Tudo começara, acreditava agora, quando na noite anterior estivera algum tempo no computador pesquisando o que a internet lhe oferecia sobre um dos seus ídolos de juventude. Procurara Charlie Chaplin e o filme “Luzes da Ribalta”. Vira algumas imagens, deliciou-se com o tema musical e, depois viu algo que não gostou. Tinha uma admiração enorme pelo grande Chaplin, que tantas vezes o fizera rir e chorar e sofreu ao ver a apresentação de um velho já senil, agradecendo uma homenagem da Academia de Hollywood. Não aquele ator que fora proscrito durante o período negro do senador Mccarthy, não podia ser o seu ídolo.

Mas para reforçar a raiva lembrou-se de tantos escritores, realizadores e atores que também tiveram que depor perante a famigerada Comissão do Senado, forçados a denunciar amigos ou apenas conhecidos, que tivessem em algum momento expressado atitudes o tivessem assistido, a uma que fosse, reunião do Partido Comunista Americano.

E um dos nomes que lhe veio à lembrança foi o do escritor e realizador Dalton Trumbo, uma das personalidades mais citadas quando se analisa o período negro da História dos EUA. E lembrou, sobretudo, o filme que uma vez vira e jurara não voltar a ver. O livro, o filme  de Dalton Trumbo “Johnny Got His Gun”, apesar do esforço que fizera para esquecer, ficara guardado algures num recanto do cérebro e fora por isso, o catalisador do pesadelo.

Bem, mas hoje esquecido os maus momentos da noite, havia que encontrar um filme protagonizado por um ator que também tivesse tido os seus problemas com a referida comissão de caça às bruxas. O ator escolhido foi Sterling Hayden e o filme, um clássico dirigido por Nicholas Ray. Escolhi “Johnny Guitar”. Fico tranquilo e certo que, esquecendo os parágrafos anteriores irão apreciar, como eu, as imagens e a canção tema do filme, vivida na bonita voz da Peggy Lee.

 

 

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

VIAGENS AO MUNDO DOS SONHOS


A ILHA DOS TRÊS MARES

 

Quando no silêncio da noite, os sonhos e as recordações se acotovelam tentando ocupar o primeiro lugar, torna-se difícil escolher um tema. As recordações da infância, criança de pé descalço, correndo por entre as pedras do campo onde nasci, ou as memórias da adolescência despertando para o mundo, lendo e ouvindo histórias fascinantes, são momentos que não se esquecem.

Neles enriqueci as minhas memórias, neles construí os meus sonhos.

Todavia, por vezes basta um pequeno episódio, por vezes quase sem relevância, para ganhar o espaço para uma pequena história.

Foi já no decorrer do final dos anos noventa, que esse episódio teve lugar.

Por razões profissionais, desembarquei com outros colegas, na Sicília, a ilha abandonada entre os três mares, berço de civilizações, tema de tantos poetas e romancistas e sinónimo de família dedicadas ao crime. E a cidade era a mártir Messina, vítima da guerra e do terramoto que ainda deixara marcas.

 

No final das reuniões, o Advogado que nos dava assessoria, um velho professor Universitário, acompanhou-nos ao aeroporto, utilizando caminhos secundários para nos mostrar a dureza dos montes, os rios de lava negra que a última erupção do Etna havia semeado, e ao longe o vulcão, que como ele nos dizia, parecia estar de mau humor.

Os Sicilianos, acrescentou o Professor, embora habituados à rudeza da paisagem, não resistiram ao apelo da emigração, partindo aos milhares, vendendo tudo o que possuíam, até a alma.

Esta pequena conversa seria para esquecer. Mas por ironia do destino, na noite em que regressei a casa, passou na Televisão um filme que me deixou atento. Era um filme dirigido pelo Giuseppe Tornatore, ele mesmo um realizador siciliano, que já havia surpreendido com um filme tão belo, que era um hino ao amor, à amizade e ao cinema. Claro, falo do ” Cinema Paradiso”.

 
E foi com esperança que assisti, vencendo o sono, ao filme “ L’Uomo Delle Stelle.

E este é o filme que vos deixo. É um filme onde até os risos sabem a fel, onde a pobreza iguala a rude paisagem das montanhas. É um filme que faz doer.
 

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

VIAGENS AO MUNDO DOS SONHOS


3 – 1944

O tremor das pernas adormecidas, por horas sentado no sofá, revivendo os sonhos de juventude, fez com que chocasse com uma mesa de apoio derrubando um livro.

Era um livro que começara a ler, mais um livro sobre a segunda guerra mundial de um autor que não conhecia, Antony Beevor.

Começara a ler e parara na introdução. Porque escrevia o autor:

” Em Junho de 1944, um jovem soldado asiático rendeu-se ao exército dos EUA, durante o desembarque na praia de Utah na Normandia.

Era coreano, chamava-se Yang Kyoungjong e atravessara meio mundo combatendo uma guerra que não escolhera.

Recrutado à força pelo exército Japonês aquando da invasão da Manchúria, fora depois feito prisioneiro pelo exército vermelho, combatera contra as forças do III Reich durante a sua campanha pelo domínio da Rússia Soviética, perdera mais uma vez, foi incorporado da Wehrmacht e para final de odisseia fora feito prisioneiro numa praia do mar do norte e mais tarde libertado pelo exército americano. Terá morrido, algures nos Estados Unidos.

Numa guerra que matou tantos milhões de pessoas, um pobre Coreano foi apenas um exemplo dos horrores, podendo ser a ilustração mais dramática da impotência da maior parte dos vulgares mortais face àquilo que pareciam ser forças avassaladoras.”

Releu o parágrafo e não pôde deixar escapar uma lágrima. Tantos livros que lera, tantos filmes que vira sobra a II guerra e afinal uma pequena história lembrara-o que as guerras vitimam pessoas, a maior parte nem o nome se conhece, pois a memória guarda e conta sobretudo as batalhas, os momentos de heroísmo, os feitos dos grande chefes. Teve sorte o soldado Coreano. Vindo de uma guerra quase esquecida, através meio mundo e sobreviveu.

E recordou que vinte anos após a captura do soldado coreano, estava ele a cumprir o seu destino, chegara o seu tempo de enfrentar a guerra colonial.

Era um jovem de 22 anos, que sempre sonhara com a guerra e teria agora oportunidade de a viver, com a responsabilidade de comandar um pelotão de atiradores que treinara no campo militar de Santa Margarida. Mas a guerra não era um desfile de vaidades. Pouco a pouco percebeu que a guerra é sobretudo uma questão de relações humanas, de resistência e sobretudo de sobrevivência. E os sonhos foram transformados no compromisso de voltar com todos soldados que com ele embarcaram, o que aconteceu.

Um dia, um amigo emprestou-lhe um livro cuja leitura recomendou. Era um livro sobre a guerra, escrito por Norman Mailer que também vivera a guerra do Pacífico, mas que optou por dar ênfase aos conflitos entre soldados, crueldade com o inimigo indefeso, o desejo de prestígio de um General precisava ganhar para pôr mais uma estrela sobre os ombros. E o amigo concluiu: Lê, vais ver que não há muitas diferenças entre as guerras.

O livro, “The Naked and the dead” perdeu-se nas mudanças de aquartelamento e não o lera.

Hoje, tantos anos passados, procurara um filme do Raoul Walsh, para ilustrar este texto mal-amanhado. Sim, dirigido por Walsh, o diretor que só usava a  pàla porque tinha deficiências de visão.

E então encontrei o filme “ The Naked and the dead” e em homenagem aos jovens do site “à Pala do Walsh” deixo ficar o trailer do filme.

E respirando com alívio, vou publicar, a banda sonora