sábado, 28 de janeiro de 2017

O V ERÃO DE 42


UM SONHO ... CONTADO

Por vezes, agora com mais frequência, sonho o passado longínquo. E revejo-me da personagem duma criança acabada de nascer. Será estranho, sinto isso, por vezes inquietante, mas poderá ser um sinal. Rever momentos duma vida preenchida e reencontrar as pessoas mais importantes poderá significar o princípio e o fim.

Era um ano difícil, duro, como todos eles, naquele tempo.

Deitada na cama de uma casa grande e pobre, perdida nos arredores de uma pequena cidade do Alto Alentejo, uma mulher ainda jovem sofria as dores do parto. Era uma mulher frágil mas determinada e dona de uma personalidade sensível mas lutadora. A seu lado uma vizinha habituada à função de parteira, tantas vezes chamada para aqueles momentos, onde uma vida se ganha ou se perde.

Esta mulher ganhara a experiência por ter assistido a tantos momentos de alegria e, também, alguns momentos de dor. O seu saber de experiência feito permitia-lhe dirigir o trabalho de parto, orientando os esforços da futura mãe e ajudada por outras mulheres mais jovens e da família da parturiente.

Como era afinal naqueles tempos, nascer ou morrer era sobretudo uma força do destino. O recurso ao hospital era um privilégio.

Daquele dia do verão de 1942, enquanto mulheres ajudavam a nascer, por este mundo milhares de pessoas morriam cada dia, vítimas inocentes duma guerra de genocídio e de interesses comerciais e financeiros. Como, aliás, todas as guerras conhecidas. E foi no calor daquele longínquo verão, que a criança nasceu. A parteira cortou o cordão e olhando a mãe dorida, anunciou:

- Vizinha é um menino, frágil mas que irá crescer para sua alegria!

E o sonho acabou.

O despertador tocou, era hora de levantar. A alegria de ter revivido os momentos em que esteve nos braços das pessoas mais importantes da sua vida, e que tantas vezes ouvira contar, tornaram-se uma força que o acompanharia por mais um dia…