domingo, 10 de julho de 2011

O RAPTO

13 – A NOITE DO CAÇADOR

Carlos presta atenção. Esta noite quero procurar um tipo que frequenta o mais conhecido dos clubes de striptease masculino, onde engata mulheres para depois fazer chantagem. Eu não sei o nome dele mas se o vir, saberei identificá-lo.
Vou precisar de ti, para escolheres um quarto numa pensão da Avenida da Liberdade, daquelas onde ninguém faz perguntas, cujas traseiras dão para a rua onde está localizado o clube mais bem frequentado.Tu sabes qual é, não sabes?
Escolhe um quarto do qual possas vigiar a entrada de pessoas e os automóveis que te possam parecer suspeitos.
Depois de tratares disso, mandas uma mensagem a dar o número do quarto. Eu irei ter contigo, levando o cavalheiro.
Ah, antes que me esqueça, abriu uma gaveta da secretária, aqui tens uma câmara de vídeo e este envelope com dinheiro para o quarto e mais que precises. Como vês é tudo muito simples e tu não corres qualquer risco. Estamos de acordo?
- Obrigado chefe por confiar em mim. O que me acaba de entregar vale muito dinheiro mas eu sei que posso resistir à tentação. Não o deixarei ficar mal, respondeu Carlos com uma lágrima no canto do olho.
- Eu sei e acredito. Agora vai lá tratar da tua vida e logo nos encontraremos.
António Pedro ficou só. Cheio de esperança procurou companhia. Discou o número de telefone da mulher e quando ela atendeu, convidou-a para jantar. Não teve sorte. Filomena estava a trabalhar no escritório, num processo urgente a não tinha tempo nem para comer.
- Olha vou jantar uma pizza e uma coca-cola, que encomendei para o escritório. Se te apetecer, aparece e dividimos o manjar. Não teremos é muito tempo para conversar. Mas se eu acabar a horas decentes e quiseres esperar podemos ir beber um copo e falar sobre …o tempo.
Desculpa, eu gostava de te ver mas, tenho um compromisso para a noite. Não dá, paciência, fica para outra vez.
- Acredita António, já estava à espera da tua desculpa. Afinal nada mudaste.
Ficou sentado à secretária fumando mais um cigarro, quando se lembrou que ainda ninguém havia mencionado, a existência de pedido de resgate. Então, a miúda foi raptada para quê?
Acho estranho, pois a Mãe ainda não falou dessa eventualidade, ou o que ela me está a contar é apenas a verdade que lhe interessa que eu saiba? Muitas dúvidas, poucas certezas, mas um facto indesmentível. A garota está desaparecida.
Creio que o indivíduo que hoje quero agarrar poderá ser uma peça fundamental.
Antes da hora de jantar, recebeu o SMS do Carlos. Dizia, tudo tratado. Quarto 103.
Eram apenas oito horas e não sabia como matar o tempo. Retirou o carro do parque e foi procurar um pequeno restaurante onde era conhecido. Comeu bem e como não havia muita clientela, ficou cavaqueando com o patrão.
Saiu, ainda era cedo para a visita que pretendia fazer e decidiu aguardar em casa a hora de sair.
Todavia estava impaciente e o tempo demorava a passar. Eram apenas vinte e três horas e já estava a circular na Rua do clube alvo, até encontrar um local vago para estacionar.
Caminhou com calma até à porta do clube nocturno. O porteiro era um velho conhecido de outros bares que o cumprimentou com toda a simpatia:
- Então senhor doutor, como vai? Já não o via há muito tempo!
- Tem razão Manuel, mas hoje apeteceu-me tomar um copo e como estava aqui perto, vou aproveitar. Mas não esperava vê-lo aqui, pois se a memória não me falha, era porteiro noutro estabelecimento. Mudou de emprego ou de patrão?
- As duas coisas. O Bar onde antes trabalhava começou a ter problemas e a clientela a fugir. Surgiu esta oportunidade, quando o porteiro deste foi despedido e o senhor Alexandre me convidou a vir trabalhar com ele. E não estou arrependido.
- Disseram-me que para se entrar é preciso um cartão e eu não tenho!
- Nem precisa, pode entrar, claro, mas olhe que isto ainda está muito fraquinho. Só lá por volta da uma da manhã é que começa o movimento. Mas é às sextas-feiras e sábados que a casa enche e tem fila de espera. Nessas noites, o controlo das entradas é mais rigoroso.
Entrou, habituou os olhos à luz difusa, que uma série de projectores, estrategicamente apontados, fazia reflectir nos globos de vidro facetados e coloridos, criando o ambiente habitual. Luz agressiva e intermitente sobre o palco deixando na penumbra a pista de dança e as mesas espalhadas ao longo da sala.
Estavam apenas meia dúzia de pessoas na sala, sobretudo homens solitários sentados ao balcão. Escolheu a extremidade mais próxima da entrada, puxou de um banco alto e encomendou um whisky duplo com uma pedra de gelo. Rodou o copo entre as mãos, aspirou o odor da bebida, fez sinal de ok e começou a beber.
Pouco a pouco foram chegando clientes, sendo mais notado um grupo bem disposto de senhoras, que se instalou nas mesas, à volta da pista. Encomendaram as bebidas, e o espectáculo começou.
A música subiu de tom, acompanhando o desfile. Os gritinhos do costume como reacção aos movimentos lânguidos e lascivos dos bailarinos subiam de tom à medida que eles iam retirando, uma a uma, as peças de vestuário.
Pelo espelho colocado atrás do balcão, António Pedro apercebeu-se da entrada de mais um noctívago. Este era especial pois era quem ele esperava. Cabelo com gel, fato impecável, pose estudada, estendeu o impermeável à senhora do bengaleiro, avançou uns passos e ficou parado na entrada, olhando com atenção para as mulheres. O caçador estava a escolher a presa.
O Investigador pagou as duas bebidas que havia consumido e foi generoso na gorjeta. Voltou-se para sair, pegou no braço do desprevenido cliente, dizendo-lhe ao ouvido:
- Não te lembras de mim? Hoje sou eu que te quero falar. Anda, como se fôssemos bons amigos e não faças ondas.
O interpelado olhou-o com surpresa, olhou para o porteiro como a pedir ajuda mas não obteve atenção. Resignou-se e mesmo a contragosto foi caminhando ao lado do Investigador até ao quarto alugado onde Carlos, de luz apagada, se entretinha a filmar o movimento dos carros. António Pedro fechou a porta, cerrou as persianas da janela e abriu a luz.
Pronto, podes sentar-te ali naquela cadeira para estares mais à vontade enquanto me contes tudo, mas mesmo tudo, para que eu não ficar desiludido e zangado!
De repente, Carlos olha para o intruso e comenta:
- Oh chefe esse gajo que aí trás não passa de um chulo bem relacionado e especialista em esquemas de chantagem! É conhecido no meio, porque apesar de explorar as vítimas, nunca foi violento e não passa de um cobardola.
- Podes ter razão, mas eu já vi uma das vítimas, com os olhos bem marcados, com os socos que ele lhe deu!
- É provável, mas só se a senhora reagiu ameaçando com a polícia. Ele tem um medo de morte de ser apanhado e de cair em desgraça junto do protector. Dizem que paga a um chefe de gang para poder trabalhar à vontade. Esse sim é um tipo perigoso, este é um só um figurão.

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