sexta-feira, 15 de julho de 2011

O RAPTO

18 – AMOR DE PERDIÇÃO

Recostou-se no cadeirão. A mulher não era fácil e deixara muitas dúvidas no ar. Ou saberá mais e escondeu ou está perdida numa teia de mentiras.
No momento lembrou-se que Edmundo dissera que o gang tinha contactos estreitos com alguém da Polícia. Sentiu-se um mal-estar, receava que as dúvidas que sentia se viessem a concretizar.
Deixara-se envolver demasiado e amaldiçoava a hora em que tinha decidido escolher aquele caminho. Perdera as referências, o casamento e ganhara angústias e sobressaltos.
Ainda não se tinha refeito das emoções e já o telemóvel tocava. Conheceu o número. Era o Carlos:
- Chefe estive a vigiar a casa do Edmundo. Aí por volta das 11 horas reparei que um jipe preto subia e descia a rua, em marcha lenta. Levava dois homens, o condutor é um segurança do clube, aquele alto e gordo. O outro ocupante nunca o tinha visto.
Tirei duas ou três fotografias e anotei a matrícula do carro.
Tive medo pelo rapaz e enquanto o automóvel foi dar a volta para inverter a marcha, fui a correr bater à porta do Edmundo, que me abriu de imediato. Estava apavorado! Ele também estava à janela e também vira o carro.
Pensei fazê-lo sair do apartamento pela porta de serviço. Dei-lhe o meu blusão para ele vestir, e assim disfarçado disse-lhe para sair, apanhar um táxi para minha casa. Dei-lhe a morada e mandei-o embora.
Eu vesti um impermeável e desci pelo elevador. No rés-do-chão saí com a maior naturalidade e vi o tal capanga mal-encarado à espera no r/c. Já na rua, andei uns metros no sentido contrário ao carro suspeito, apanhei um táxi, dei umas voltas para ver se era seguido, e estou-lhe a falar aqui de casa.
- E o Edmundo desapareceu, claro!
- Não chefe. Está aqui comigo e vamos almoçar em casa. Os meus Pais foram visitar a minha Avó. Ele perguntou-me se o Doutor era de facto pessoa para o ajudar a sair para França, onde tem família. Como eu lhe dei essa garantia ele contou algo que escondera.
- Doutor arranje um pouco de tempo e venha a minha casa. É melhor ouvir da boca dele, pode ser?
- Claro que vou, espera por mim.
Lembrou-se que na gaveta da secretária tinha um álbum de fotografias com muitos dos antigos colegas, em grupo ou isoladas, algumas bem antigas outras recentes tiradas durante a festa de despedida que colegas e amigos lhe ofereceram. Meteu tudo na maleta e conduziu até casa do amigo.
A sua intuição dizia-lhe que uma parte do segredo por detrás do desaparecimento de Carolina dependeria de Edmundo e esperava que ele conseguisse identificar o Polícia ligado ao negócio dos estupefacientes.
Em casa do amigo, encontrou outro Edmundo. Já não tinha aquele ar insolente com que uma vez o enfrentara e tinha o medo reflectido no olhar.
Edmundo, nervoso, começou a falar.
Começou por lamentar não ter tido a coragem de recusar o serviço que lhe fora proposto. Se o recusasse não estaria agora escondido e a recear pela vida. Tudo começara quando um homem que frequentava o clube, o aliciara para a conquista da mulher que, naquela sexta-feira, estava com um grupo numa festa no bar.
O desconhecido garantira-lhe que tudo estava combinado. A Doutora sabia de tudo, a dormida num hotel as fotografias e o vídeo no quarto de hotel, em que a Doutora participara de livre vontade, até ao montante a exigir pelas provas, tudo fora delineado por outro e ele apenas executaria. Do trabalho recebera mil euros, o resto fora para o mandante.
Mas cometera um erro, tentara vender mais algumas fotografias, exigindo o valor de cinco mil euros. E foi ao tentar cobrar aquele valor que se vira envolvido numa história muito mais complexa do que imaginara.
António Pedro ouviu tudo com atenção mas o seu pensamento estava bem longe dali. Afinal o que ouvira não o tinha surpreendido. Rompeu o silêncio que se instalara naquela casa, dizendo:
- Edmundo podes correr perigo, eu sei, e por isso cumprirei o que te prometi e vou ajudar a tua saída para o estrangeiro. Mas antes quero que fiques com este conjunto de fotografias e com calma vê se numa ou em outra reconheces a pessoa que te contratou. Faz isso com muito cuidado, repete as vezes que forem necessárias e se encontrares assinala com um marcador.
Se encontrares a pessoa telefonem para mim, seja a que hora for e eu virei.
Mas vê com atenção. Pensa que há em pessoas em risco.
Entretanto o Carlos vai programar contigo a tua viagem. Se for preciso dinheiro eu pago.
Sem dizer mais nada, deixou a casa e ao sentar-se no automóvel, sentiu suores frios que lhe escorriam por todo o corpo, como um acesso febril. Recostou a cabeça no volante, ficou assim por largo tempo até que controlou a respiração. Depois recuperou força e seguiu para casa.

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