quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

DUETO IMPREVISTO





















VIOLONCELO

PRELUDE

Eram a hora de saída do emprego e como, geralmente acontece, as nuvens que durante o dia se foram acumulando no céu, transformaram-se em chuva forte e batida pelo vento. Sofia, saíra a correr do ensaio porque não queria perder o Metro do costume. Não era longe, mas a chuva persistente tinha feito com que o guarda-chuva tivesse servido de fraca protecção.Não obstante a incomodidade da roupa molhada, valera a pena o esforço da corrida, porque iria chegar à Estação do Cais do Sodré, a tempo de apanhar o comboio, e de preferência encontrar um lugar livre.
Sentia-se cansada. A orquestra preparava uma série de concertos e o maestro pedia sempre mais um esforço. Sofia, percebia e dava sempre tudo o que podia. Porém havia dias em que os tons do violoncelo não eram tão puros como a partitura exigia. Bach, era sempre um desafio.Sentada no lugar da janela, ia relembrando os dois últimos da sua vida. O divórcio, que lhe deixara marcas que só o tempo faria esquecer.
Tinha duas filhas; Carolina, com quinze anos de idade, boa aluna no liceu mas já com uma personalidade bem vingada e, pois isso, tendo já alguns assomos de independência. Carolina era fruto de uma ligação imatura, e que durara o sopro do vento. Sofia soubera conduzir a infância da filha, fazendo de Mãe e Pai e Carolina, nem uma vez sequer perguntou pelo Pai.
Catarina, jovem de oito anos de idade, doce e terna, tinha nascido do seu casamento com Artur. Tinha sido um casamento feliz, feito de partilha e cumplicidade. Artur adorava a filha e para ele, Carolina merecia-lhe o mesmo carinho. Foram oito anos felizes.
Encontrara Artur, num almoço de antigos alunos do colégio. Tinham tido uma paixoneta de liceu mas a vida afastou-os. Sofia apaixonou-se pela primeira vez na sua vida. Dali ao casamento foi um passo.
Mas a vida tem, como uma peça musical, vários andamentos. E ela não soube interpretar alguns cambiantes. Artur tinha mudado de trabalho, passava muitos dias ausentes no País e do Estrangeiro. Nunca se esquecia de telefonar às garotas e para ela havia sempre um longa conversa por telemóvel ou pela Internet.
E o destino pregou-lhe uma partida. Quando julgava Artur em Espanha, encontrou-o a passear com uma outra mulher, num local onde não tinha por habito ir.
Depois, foi a dúvida a desconfiança e por final o divórcio. Faz hoje dois anos, pensou.
Agora aos trinta e oito anos de idade, a sua vida era a orquestra, a correria de todos os dias, sair da Estação de Oeiras, pegar no carro lá estacionado, passar pelo super mercado e ir para casa. Ali com as duas filhas estava, finalmente, em paz.


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